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Veto de Lula à retomada de veículos sem autorização da Justiça pode manter altos juros de financiamentos
Ministério da Fazenda apostava que a possibilidade de apreensão extrajudicial pudesse baixar a taxa nos empréstimos para compra de carros e motos, ao reduzir os riscos das financiadoras
Por Letycia Cardoso
— Rio de Janeiro
(Foto: Fabio Rossi / Agência O Globo)
Ao sancionar o marco das garantias, com o objetivo de reduzir o custo dos empréstimos no país, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou um trecho do texto que autorizava a apreensão de veículos sem autorização judicial, caso o bem não fosse entregue voluntariamente no prazo legal. Executivos do setor e advogados alertam, no entanto, que isso pode fazer com que as taxas de financiamento de carros e motos permaneçam elevadas.
O argumento usado para o veto foi que a proposta traria um “vício de inconstitucionalidade” ao criar uma modalidade extrajudicial de busca e apreensão do bem móvel que facilitaria a efetivação da garantia.
Na prática, nada muda para o consumidor. Atualmente, caso um motorista compre um carro financiado e fique inadimplente, independentemente do número de parcelas atrasadas, a instituição pode solicitar à Justiça a tomada do veículo.
A advogada especialista em contencioso cível Marina de Barros Monteiro, sócia do escritório Miguel Neto Advogados, explica que, antes disso, a financiadora deve dar ao consumidor a oportunidade de quitar a dívida. Caso ele não pague, o credor precisa comprovar que o devedor não cumpriu com a obrigação.
— O processo judicial para a tomada do veículo nesses casos segue um procedimento rigoroso, que pode levar meses. O processo deve começar com uma citação, dando a oportunidade de o devedor quitar a dívida ou de demonstrar que a tomada do bem é ilegítima — explica Marina.
Expectativa é que juros para financiamento de veículos permaneçam altos — Foto: Lucas Tavares
Luan Dantas, advogado especialista em direito do consumidor, reforça que, antes da apreensão, é necessário comprovar a notificação do devedor sobre o atraso e o não pagamento da dívida mesmo após o aviso.
Ele ainda estima que o pedido de busca e apreensão ocorre, em média, depois de três meses do início do atraso dos pagamentos, quando se presume a inadimplência total do contrato. Até chegar a esse ponto, as instituições financeiras em geral tentam resolver de forma administrativa com seus clientes, oferecendo, por exemplo, mais prazo e parcelas menores.
— A demora da ação de busca e apreensão é relativa, pois depende da vara em que é proposta. Mas o tempo médio entre a liminar e a tomada do carro pode ser de menos de uma semana — aponta.
Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a aquisição de carros e motos pode ser feita nas modalidades leasing —um tipo de empréstimo com a chance de compra, em que o consumidor só se torna dono do veículo após pagar todas as prestações — ou por financiamento, via Crédito Direto ao Consumidor (CDC). Nos dois casos, não havendo pagamento das parcelas, é prática dos bancos contatar o cliente para oferecer condições mais favoráveis ao pagamento antes de seguir com o processo de retomada do veículo. O procedimento, no entanto, segue os mesmos trâmites.
A Febraban diz que, enquanto o “leasing é mais indicado a empresas, por razões tributárias”, o CDC é a opção mais usada por pessoas física na hora de adquirir um carro ou moto “devido às vantagens em relação a taxas de juros e redução no IOF”. Nessa modalidade, segundo o Banco Central, as taxas de juros giram em torno de 1,80% ao mês.
Juros altos para financiar
Enilson Sales, presidente da Federação Nacional das Associações dos Revendedores de Veículos Automotores (Fenauto), calcula que cerca de 60% dos 20 milhões de veículos comercializados no Brasil, entre novos e usados, são financiados. Desse total, 5% dos consumidores ficam inadimplentes. A burocracia para retomar os automóveis faz com que pouco mais de 3% sejam efetivamente retomados. Por isso, Enilson acredita que o veto de Lula à possibilidade de apreensão de veículos sem autorização judicial mantém o risco alto para quem financia.
— A melhor das hipóteses agora é que juros permaneçam altos — opina.
A advogada Marina Monteiro também avalia ser difícil o recuo dos juros para financiamentos de veículos automotores:
— Segundo a avaliação do Ministério da Fazenda, a possibilidade de apreensão extrajudicial teria a benesse de baixar a taxa de juros nos empréstimos para a aquisição de veículos, pois a medida reduziria os riscos das financiadoras. Com o veto, os juros podem não recuar.