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Pagamento do IPTU, despesas com obras, sublocação de garagem: tire 10 dúvidas comuns sobre aluguel
EXTRA ouviu especialistas em Direito Imobiliário sobre os temas
Por Ana Clara Veloso e Caroline Nunes
— Rio de Janeiro
Foto: Editoria de arte
Quem paga o IPTU de um imóvel alugado? Obras de melhoria feitas pelo inquilino são abatidas do valor do aluguel? E antes de devolver as chaves ao proprietário, ao fim do contrário, é preciso pintar a fachada de uma casa? Na relação entre locador e locatário, surgem incertezas todos os dias. Para auxiliar os dois lados a entenderem seus direitos e deveres, o EXTRA levou dez perguntas comuns a especialistas em Direito Imobiliário, e as respostas estão a seguir.
O contrato de aluguel pode ser firmado entre duas partes sem a consulta de um advogado, mas não é o recomendado. Também não é exigida a intermediação de uma imobiliária no negócio. Mas, para o presidente da Associação Brasileira das Administradores de Imóveis (Abadi), Marcelo Borges, é inclusive por conta da grande complexidade envolvida nessa relação jurídica que os brasileiros, em geral, preferem ofertar e procurar imóvel para alugar em imobiliárias. O que locador e locatário podem esperar delas, então?
— Durante a locação,a imobiliária ou administradora assume o papel de promover a cobrança dos aluguéis e encargos, como cota condominial, IPTU, taxa de incêndio etc. E cuida de todas as intercorrências que possam surgir, como necessidades de obras no imóvel, controle da inadimplência, negociações de valores, cumprimento das obrigações tributárias, entre diversos eventos que surgem — relata Borges.
Mas o trabalho começa mesmo antes. A avaliação do imóvel para a sua oferta ao mercado através de anúncios e organização das visitas dos interessados até a concretização do contrato são responsabilidades das imobiliárias. Assim como fazer uma vistoria no imóvel, para posteriormente garantir o cumprimento de uma das leis da locação: a obrigação do inquilino restituir o imóvel ao locador, ao fim do contrato, no mesmo estado de conservação em que o recebeu.
— Assim, após o encerramento do contrato, a imobiliária deve providenciar uma vistoria em conjunto com o locatário, identificando o cumprimento de obrigações negociadas entre as partes, como a pintura do imóvel — explica Ermiro Neto, professor de direito imobiliário da Faculdade Baiana de Direito.
Para prestar esses serviços, as imobiliárias, em geral, cobram o valor do primeiro aluguel do imóvel e uma comissão mensal sobre o aluguel. Segundo a Abadi, não há um parâmetro disposto em lei, mas o mercado no Rio de Janeiro vem praticando entre 8% a 10% como taxa de administração mensal.
Quem deve pagar o IPTU e a taxa de incêndio?
O diretor de condomínio e locação da Abadi, Marcelo Borges, explica que os pagamentos do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e da Taxa de Incêndio, em regra, são responsabilidade do proprietário. Mas podem ser transferidas para o locatário por contrato. No Rio de Janeiro, isso é um hábito e praticamente 100% dos locatários pagam o imposto e a taxa.
Como pode ser parcelado, é comum que o locatário seja cobrado mensalmente, na mesma data em que é devido o valor do aluguel, durante o período de uso do imóvel, diz Mariana Carneiro Lopes Muniz de Oliveira, sócia do escritório Lopes Muniz Advogados.
Ao sair de um imóvel, há faturas a pagar no mês seguinte?
Taxa condominial e despesas ordinárias são sempre pagas antes do mês de referência, mas o aluguel é pago no mês subsequente. Por isso, pode haver dúvidas sobre quais cobranças serão feitas no mês seguinte ao da saída de um imóvel alugado. O aluguel ainda será pago, mas a taxa condominial já será responsabilidade do locador ou do próximo locatário.
Rodrigo Torres, docente da Estácio e especialista em Direito Imobiliário, lembra ainda que contas de consumo, em geral, são faturadas numa data e creditadas no vencimento seguinte. Ou seja, faturas de energia, gás e água também deverão ser pagas.
É preciso pedir o desligamento de serviços, como energia elétrica e gás, ao deixar um imóvel?
Para o religamento de serviços, as empresas, muitas vezes, cobram uma taxa. Por isso, ao alugar um imóvel é comum que o locatário peça ao antigo morador ou responsável pelas contas não solicitar a suspensão dos serviços. Mariana Carneiro Lopes Muniz de Oliveira entende que, ao invés do desligamento e do religamento, é possível que as partes peçam a transferência de titularidade das faturas, que costuma ser gratuita. Ela recomenda que as duas partes definam contratualmente um prazo para isso, verificando antes se não há alguma pendência de pagamento. Se os dados não forem fornecidos para solicitar a transferência, o desligamento deve ser feito.
Rodrigo Torres reforça que a relação com o prestador de serviços de gás, energia e água é direta com o consumidor e fica vinculada ao nome dele. Não é incomum que uma pessoa que morou num endereço veja, anos depois, que tem uma dívida de centavos de uma relação que acabou faz tempo.
Instalação de ar-condicionado split, revisão do gás e obras: quem paga?
Por regra, as obras estruturais são responsabilidade do locador, já as obras decorrentes do uso são do locatário. Da mesma forma, a revisão de equipamentos que estão dentro do imóvel, como o de gás, é do proprietário do imóvel. O professor de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) Gustavo Kloh ressalta que, no caso da revisão do equipamento de gás, quem paga é o locador, mas quem é responsável pela quitação das tarifas é o locatário, assim como ocorre com as taxas mensais de luz e de telefone.
Neste sentido, as despesas relacionadas ao conforto, como a instalação de um ar-condicionado split, devem ser reembolsadas se houver autorização do proprietário do imóvel. Para Ermiro Neto, professor de Direito Imobiliário da Faculdade Baiana de Direito, as partes devem negociar previamente as responsabilidades relacionadas às despesas, se “estes investimentos serão do locador, do locatário, se será abatido do aluguel e se ficará no imóvel após a entrega”.
O inquilino pode alugar sua vaga na garagem para outro morador do condomínio?
Quando o inquilino não possui veículo e o aluguel do imóvel dá direito a uma vaga de garagem no condomínio, uma solução adotada por alguns brasileiros é alugar o espaço para um vizinho. Mas, apesar de comum, a prática nem sempre é legal do ponto de vista contratual. Isso porque, segundo Gustavo Kloh, a sublocação só pode acontecer quando for autorizada, sendo o locatário a pessoa que deve utilizá-la diretamente.
Kloh acrescenta que “a sublocação não é uma regra no contrato de locação, mas sim uma exceção”. Da mesma forma, o professor de Direito Imobiliário da Faculdade Baiana de Direito Ermiro Neto destaca que um caminho para o inquilino que deseja regularizar a sublocação é recorrer a autorização do locador. Além disso, o especialista aponta que a prática também deve estar “observada nas regras de convenção do condomínio”.
O proprietário pode colocar um imóvel para alugar com cômodo ou armário trancado?
Os especialistas consultados enfatizam que não há nenhum problema em um locatário optar por disponibilizar um imóvel com um armário ou cômodo trancado. Ermiro Neto, da Faculdade Baiana de Direito, destaca que não há qualquer impedimento legal nesse sentido, desde que essa condição esteja claramente estabelecida no contrato de aluguel.
Da mesma forma, Gustavo Kloh, da FGV, destaca que se essa prática de manter um espaço trancado for acordada entre as partes previamente, está perfeitamente alinhada com o princípio da liberdade contratual. No entanto, ele ressalta que o inquilino também possui a liberdade de solicitar alguma compensação – inclusive financeira – pela restrição de acesso a determinados espaços, uma vez que isso implica na impossibilidade de desfrutar plenamente de todas as áreas do imóvel.
Como se preparar para devolver o imóvel?
De acordo com os especialistas, a preparação para devolver o imóvel deve se iniciar desde o momento em que o locatário assina o contrato. Ermiro Neto, da Faculdade Baiana de Direito, aponta que é importante “ter clareza quanto as obrigações na entrega”. Para o professor, os contratos devem ser claros, apresentando as responsabilidades de cada parte para esse momento.
Gustavo Kloh, da FGV, ressalta que o inquilino deve estar atento as datas de devolução, pois o valor pago deve mudar de acordo com o dia de devolução das chaves. Desse modo, se um inquilino sai do imóvel na metade do mês, “ele deve pagar a metade do aluguel, a metade do condomínio, a metade do IPTU” e assim por diante. Além disso, Kloh diz que é preciso ter em mente que que o imóvel será vistoriado ao fim do contrato.
É preciso pintar paredes, fachada e muro de um imóvel alugado ao fim do contrato?
A lei de locação atribui ao locatário a obrigação de, ao fim da locação, restituir o imóvel ao locador no mesmo estado de conservação em que o recebeu, salvo as deteriorações decorrentes do uso normal. Ou seja, ele é obrigado a pintar o imóvel, inclusive com a mesma cor em que o recebeu. Por estarem mais expostas a efeitos do sol e da chuva, no entanto, o estado das pinturas externas é considerado decorrente do uso normal do imóvel, e não precisam ser recompostas se não estiver estabelecido em contrato, avalia Mariana Carneiro Lopes Muniz de Oliveira.
O que, infelizmente, acontece, ressalta Rodrigo Torres, é que há uma situação de vulnerabilidade de quem loca e, ao encontrar uma casa que satisfaz suas necessidades estratégicas, ele tende a assinar qualquer termo.
O que pode ser retirado do imóvel alugado após o fim do contrato?
Em regra, o inquilino apenas deve levar os bens que lhe pertencem, sendo proibido retirar os que já equipavam o imóvel, afirma William Adib Dib Junior, sócio fundador na Dib, Almeida, Laguna e Manssur – Sociedade de Advogados. Melhorias feitas pelo locatário, autorizadas e compensadas pelo locador com abatimentos no aluguel, ficam também retidas no imóvel. Por outro lado, caso tenha instalado ar-condicionado, fechadura eletrônica ou mesmo armários no imóvel, sem ser ressarcido por isso, o inquilino pode retirá-los, desde que não provoque prejuízos às condições da moradia ou que recomponha, em seguida, o imóvel ao seu estado original.
Antes de decidir investir em mudanças num imóvel alugado, é importante ter em mente que o dono do imóvel não tem qualquer obrigação de indenizar, ao fim do aluguel, o inquilino por qualquer benfeitoria voluptuária (obra de valorização ou embelezamento, mas que não era necessária) que seja deixada no imóvel, como armário embutido colocado ou vaso sanitário trocado.
Em que situações o locador pode solicitar o despejo? Quanto tempo leva a ação?
Uma ação de despejo, segundo o professor de Direito Imobiliário Ermiro Neto, é iniciada quando o locatário se recusa a deixar voluntariamente o imóvel. Essa medida tem por objetivo garantir a retirada do ocupante e a devolução do imóvel ao locador.
O especialista ressalta que a ação pode ser solicitada caso haja o término do contrato de locação ou o descumprimento das disposições da Lei de Locações, que é uma legislação destinada a regular as relações entre locatários e locadores de imóveis.
Além disso, Gustavo Kloh, da FGV, acrescenta que uma ação de despejo pode ser motivada pela falta de pagamento do aluguel ou pelo descumprimento do contrato ou infrações contratuais. Segundo ele, esse processo pode se estender por cerca de seis meses.
Diálogo é a melhor via para resolver conflitos
Atraso no pagamento, problemas com a manutenção do imóvel e queixas de vizinhos. Morar em um novo lugar pode representar a realização de um sonho, mas após a assinatura do contrato de aluguel, surge uma nova relação entre proprietário e inquilino, que pode ser desgastante em alguns casos.
De acordo com especialistas, o primeiro caminho para resolver conflitos entre as partes é a negociação direta, e quando isso não for suficiente, uma alternativa é buscar a Justiça. Mas isso pode ser cansativo. O professor de Direito Imobiliário Ermiro Neto, da Faculdade Baiana de Direito, sugere evitar ao máximo essa opção, pois “um litígio em contratos de locação é caro e leva tempo”.
— Qualquer outra solução consensual será mais barata e adequada do que aguardar uma decisão o Poder Judiciário, daí a importância de se buscar negociar, ou mesmo mecanismos formais de resolução de conflitos, como a mediação — avalia.
Um dos caminhos citados é a mediação, apontada por ser mais rápida, econômica e trazer resultados mais eficientes para as partes. De acordo com Andrea Maia, Vice-Presidente de Mediação do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA), o método costuma se adequar a conflitos envolvendo relações que se prolongam no tempo, como é o caso das locações.
— O mediador auxilia as partes a identificar as raízes do conflito e a focar nas questões que realmente interessam para elas. O mediador, então, os ajuda a pensar em múltiplas possibilidades de solução — explica
Maia ressalta ainda que a mediação não exclui a possibilidade de as partes recorrerem a outras formas de solução, como o processo judicial, se assim desejarem.