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Legalidade de greve por razões políticas não é consenso entre especialistas

4 de outubro, 2023

TST tem jurisprudência contra esse tipo de ação, mas organismo internacional do qual Brasil faz parte defende que elas devem ser permitidas

Carlos Petrocilo
SÃO PAULO

(Foto: Zanone Fraissat/ Folhapress)

A legalidade da greve dos servidores do transporte público, classificada como política pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), é uma bola dividida entre advogados e a Justiça do Trabalho.

De um lado, a Constituição assegura o direito de greve e a decisão sobre os motivos pelos quais a manifestação é convocada ao trabalhador. Por outro, há jurisprudência no TST (Tribunal Superior do Trabalho) que define a greve como abusiva caso haja caráter político.

“A lei [artigo 9º da Constituição] não estabelece uma categoria de greve. Isto foi um entendimento criado pela doutrina e pela jurisprudência. Todo o contexto deverá ser analisado, não é a privatização que vai gerar a legalidade ou a abusividade [da paralisação], mas sim se houve violação de direitos coletivos”, afirma a advogada Giovanna Parga Martinez, do escritório Mello Torres.

Para Antonio Rodrigues de Freitas Júnior, advogado e professor de direito do trabalho da USP (Universidade São Paulo), os trabalhadores definem o momento e os objetivos da paralisação amparados na Constituição Federal e na doutrina da OIT (Organização Internacional do Trabalho).

A missão deste órgão, vinculado à ONU (Organizações das Nações Unidas), é promover igualdade e condições de trabalho. O Brasil foi membro fundador da OIT, criada em 1919.

“A OIT já se posicionou sobre casos assim no Brasil e afirma que a greve não vale apenas para reivindicação salarial ou condições de trabalho”, diz Freitas Júnior.

Os casos citados pelo professor envolvem as atividades de petroleiros. No primeiro deles, em 1995, a OIT considerou que o direito de greve dos petroleiros foi violado e recomendou que o governo facilitasse a reintegração de 59 demitidos. A paralisação durou 30 dias, e o TST considerou o movimento abusivo.

Por fim, em 2021, o TST considerou, por maioria dos votos, que a greve dos petroleiros em 2018, que levou à paralisação de caminhoneiros, também foi abusiva e, desta vez, teve caráter político.

Relator deste caso, o ministro Ives Gandra Martins vislumbrou que “quando a motivação desborda para o campo político, a greve não se insere no direito coletivo dos trabalhadores, pois a disputa é, na realidade, político-partidária”.

A FUP (Federação Única dos Petroleiros) deflagrou uma greve contra as privatizações. O movimento durou um dia e meio.

Após a decisão do TST em 2021, a FUP e a CUT (Central Única dos Trabalhadores) protocolaram representação na OIT, que reiterou o entendimento do primeiro caso, o da década de 1990, e orientou o Judiciário a repensar o sistema de multas aos sindicatos.

“Há disputas de entendimentos, a visão pode ser dos empresários, dos empregados, do governo, da OIT e dos sindicalistas”, afirma Freitas Júnior.

“Entre eles, o entendimento da OIT é o que se mostra mais legitimado pela natureza tripartite [reúne representantes de empresários, trabalhadores e governos] das decisões e pela credibilidade da instituição”, completa o professor.

Já o advogado Marcel Zangiácomo considera que a politização da greve é subjetiva e não deverá influenciar no julgamento da ação. “Não vejo que a fala do governador de que a greve é política deverá influenciar no julgamento. Isto, até aqui, é mais um posicionamento do governador do que qualquer posição jurídica”, diz Zangiácomo.

Na tentativa de suspender a greve na Justiça, o Metrô afirmou que o movimento é abusivo e tem caráter político. No entanto, o desembargador Celso Ricardo Peel Furtado de Oliveira não entrou nesta seara ao estipular uma multa de R$ 500 mil para o sindicato, caso os funcionários não mantivessem a operação do metrô em 100% nos horários de pico e, nos demais horários, 80%.

Segundo ele, a obrigação de manter o funcionamento do metrô era necessária porque se trata de um serviço essencial.

“Eventual uso político para deflagração do movimento paredista, será objeto de futuro julgamento do mérito, pelo Colegiado desta Seção Especializada”, escreveu Oliveira.

Ao convocar entrevista para falar sobre as paralisações, Tarcísio disse que a greve dos servidores do Metrô, da CPTM e da Sabesp tem cunho político e é ilegal. “No ano que vem temos eleições municipais e está muito clara a motivação deles. Como vamos ter um prefeito que não dialoga com o governo?”, afirmou.

O Sindicato dos Metroviários rebateu declarações do governador. “As privatizações ameaçam o emprego, elas ameaçam direitos dos trabalhadores. Então, essa greve tem uma motivação trabalhista também”, disse Camila Lisboa, presidente do Sindicato dos Metroviários.

https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2023/10/legalidade-de-greve-por-razoes-politicas-nao-e-consenso-entre-especialistas.shtml

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