PORTFÓLIO

Ferramentas de Direito Administrativo Negocial no estado de São Paulo
Guilherme Amorim Campos da Silva
Entre as ações e medidas específicas previstas no Plano Anticorrupção [1] do Estado de São Paulo, em 25 de dezembro de 2023, a Controladoria Geral do Estado de São Paulo deu um passo fundamental para a eficiência da sua atividade sancionatória, por meio da Resolução nº 25/23. Com a publicação deste normativo estruturante, o órgão público estabeleceu os critérios para a realização do cálculo para a aplicação da sanção de multa e o procedimento do julgamento antecipado nos processos administrativos de responsabilização pela prática de atos contra a administração pública previstos na Lei Federal nº 12.846/2013.
A base de cálculo da multa estabeleceu-se como o faturamento bruto da pessoa jurídica no último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo de responsabilização (PAR), excluídos os tributos. Em seguida, a norma previu as hipóteses de aumento e diminuição do valor pecuniário da multa, levando em consideração fatores como a gravidade da infração e/ou a cooperação da pessoa jurídica para a apuração dos atos.
Estes critérios dialogam com a construção de uma culpabilidade própria da pessoa jurídica, dissociada dos atos das pessoas físicas integrantes de suas estruturas de gestão e deliberação. Esta aproximação está bastante alinhada com a nítida separação dogmática entre a pessoa fictícia e seus sócios, conforme previsão salutar do artigo 49-A do Código Civil.
A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, com a finalidade de estimular empreendimentos para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício da sociedade brasileira. Logo, nada mais natural também que, incorrendo na prática de atos ilícitos devidamente comprovados, seja a pessoa jurídica e não os seus sócios convocados para responderem com seu patrimônio.
Julgamento antecipado de processos administrativos
Neste sentido, reconhecendo os efeitos nocivos em cascata de processos administrativos sancionatórios para as pessoas jurídicas com fins lucrativos na dimensão das suas funções sociais e da preservação da atividade produtiva, a Controladoria Geral do Estado de São Paulo disciplinou as hipóteses de julgamento antecipado dos referidos processos para a solução célere dos mesmos.
A partir do reconhecimento da prática do ato lesivo pela pessoa jurídica e o ressarcimento integral do dano e pagamento da multa administrativa, a empresa fica isenta da publicação da sentença condenatória e, cumpridos os requisitos do negócio jurídico processual, é excluída do Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP).
Na realidade atual das contratações públicas e privadas em que as regras de conformidade influenciam a celebração de novos negócios, a exclusão do CNEP é um grande incentivo para adesão ao julgamento antecipado, na medida em que a inserção no CNEP é fator impeditivo em uma série de contratações. Além disso, o julgamento antecipado tem reflexos positivos em ações de improbidade administrativa que versam sobre os mesmos fatos, impedindo a condenação por ato ímprobo.
Princípio da legalidade
Na condução do primeiro termo de julgamento antecipado no âmbito da Controladoria Geral do Estado de São Paulo, publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo no dia 26 de dezembro de 2024, restou evidente a postura pragmática do órgão público para a celebração do ajuste de forma a prestigiar o princípio da legalidade estrita, a celeridade e a promoção da justiça. Com satisfação, nossa banca de advogados e advogadas contribuiu no deslinde deste primeiro caso paradigma em nosso Estado.
O procedimento de julgamento antecipado ainda comporta espaços para aperfeiçoamento, como costuma ocorrer com toda dinâmica que pretende inovar a gestão pública. A forma e os prazos de pagamento das obrigações financeiras, como o uso de precatórios e o parcelamento, podem ser duas ferramentas importantes para a evolução do instituto no Estado de São Paulo.
Com a resolução de um processo que poderia perdurar anos a fio, com altos custos transacionais para ambas as partes, a celebração do acordo de julgamento antecipado acaba por satisfazer as pretensões de todos os atores envolvidos na relação processual e viabiliza a correção de rota efetiva para a pessoa jurídica sem deixar que sua atividade produtiva seja inviabilizada.
[1] O Decreto Estadual/SP nº 67.683, de 03 de maio de 2023 instituiu o Plano Estadual de Promoção de Integridade.
Guilherme Amorim Campos da Silva
é sócio titular de Rubens Naves, Santos Jr. Advogados e doutor em Direito Constitucional pela PUC-SP.
Daniel Chierighini Barbosa
é sócio do escritório Rubens Naves Santos Jr. Advogados e mestre em Direito Civil e em Ciência Política.
Roberto Nucci Riccetto
é sócio do escritório Rubens Naves Santos Jr. Advogados e pós-graduado em Direito Administrativo.