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PORTFÓLIO

Entenda o que é a ‘solução amigável’ que pode colocar fim à relicitação de Viracopos e manter concessão atual

16 de fevereiro, 2023

Por Marcello Carvalho, g1 Campinas e Região

(Foto: Ricardo Lima/Divulgação)

Depois de recorrer ao processo de relicitação como alternativa à crise financeira, a concessionária Aeroportos Brasil, que administra o Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas (SP), pode conseguir interromper o processo e se manter no comando do ativo. A eventual reviravolta acontece porque o processo está travado há 11 meses no Tribunal de Contas da União (TCU), após o ministro relator pedir um cálculo de indenização à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

O impasse, somado a argumentos reunidos pela concessionária, e expostos para o TCU analisar[veja abaixo quais são], de que a permanência é mais vantajosa para a operação do aeroporto, trouxe à tona a chance de manter a atual concessão. O assunto já é discutido internamente pelo ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França. No entanto, a intenção da concessionária em permanecer não é o suficiente. A decisão de não levar à frente a relicitação tem que partir do governo federal.

O g1 conversou com dois especialistas para entender o que é de fato a solução amigável que pode colocar fim à relicitação de Viracopos e quais implicações elas têm. Confira abaixo.

O que é a solução amigável da relicitação?

O contrato de concessão prevê, em caso de quebra da concessão pelo poder concedente, que é o governo federal, a possibilidade de solução amigável, desde que a concessionária prove que reúne condições de permanecer à frente do aeroporto. A informação é do advogado Luiz Felipe Pinto Lima Graziano, especialista em concessões.

De acordo com ele, no caso específico de Viracopos, não houve um descumprimento voluntário do contrato de concessão, mas sim um conjunto de fatores, “alguns alheios à concessionária”, que forçaram a opção da relicitação e inviabilizaram o cumprimento do vínculo. Além disso, o advogado afirmou que a caducidade da concessão é uma opção da União e não uma obrigação.

“Quando se considera o conjunto de variáveis existentes, é preciso que se rememore que a lógica dos contratos de concessão é a sua manutenção. A relicitação deve ser considerada como exceção, aplicável apenas quando os problemas não possam ser resolvidos de outra forma que assegure a continuidade de contratação, em verdadeira alternativa menos traumática à declaração de caducidade”, explicou.

Quando ela acontece?

O advogado especialista em direito público e regulatório Felipe Estevam afirmou que a logica da relicitação é a de assegurar a continuidade da prestação dos serviços. Portanto, caso a concessionária comprove as capacidades e habilitações necessárias para dar continuidade ao empreendimento, é mais vantajoso e mais eficiente que ele mesmo continue a execução contratual.

“Se assim for, será preciso desfazer o termo aditivo já firmado, bem como garantir todas as condições de habilitação do concessionário”, disse.

Quais são os argumentos de Viracopos?

Antes de colocar o edital de um possível no leilão em votação, o Tribunal de Contas da União vai analisar cinco pedidos de Viracopos colocados pela concessionária como essenciais para que o processo caminhe e que indicam a intenção do grupo de manter o contrato, que tem duração de 30 anos.

Entre os cinco pedidos da concessionária enviados ao TCU, está o argumento de que, em caso de realização de um novo leilão, é possível que o novo concessionário não assuma o empreendimento, ainda que pague a contribuição inicial, porque a Aeroportos Brasil, que faz a gestão do terminal desde 2012, afirma que só sairá se for completamente indenizada.

Além disso, a Aeroportos Brasil defende a qualidade da administração do terminal, que bateu recorde de passageiros em 2022, para argumentar de que seria ruim para o funcionamento do aeroporto a entrada de um novo concessionário. Veja todos os argumentos:

  1. Argumento de que a viabilidade do projeto de relicitação depende do valor da indenização, tendo em vista que toda a indenização deve ser paga pelo concessionário entrante;
  2. Argumento de que não há justificativa econômica para impor ao Erário o dever de quitar valor de indenização, na hipótese de o valor de outorga inicial ser inferior ao valor devido a título de indenização ao anterior contratado;
  3. Argumento de que existe risco de o novo concessionário pagar a contribuição inicial e não assumir a operação do aeroporto, haja vista que a ABV somente sairá quando for integralmente indenizada;
  4. Argumento sobre a excelência operacional de Viracopos, que não justificaria um processo de relicitação; (Aeroporto foi eleito em 2022 o 4º Melhor Aeroporto do Mundo pela AirHelp)
  5. Argumento de que inexiste estudo técnico que justifique a vantajosidade das condições para a relicitação, em violação à supremacia do interesse público, o princípio da legalidade e o princípio da eficiência administrativa.

Cálculo de indenização

O cálculo de indenização define qual valor será pago ao atual concessionário e qual das partes envolvidas vai fazer esse acerto. Esta é a prioridade máxima da Aeroportos Brasil durante a relicitação. O impasse, que fez o processo não avançar, possibilitou que a concessionária reunisse argumentos para defender que um novo leilão seria mais prejudicial do que benéfico ao andamento do terminal.

O edital do novo leilão seria votado no Tribunal de Contas da União no dia 1º de fevereiro, mas foi novamente retirado da pauta.

Arbitragem

A concessionária Aeroportos Brasil Viracopos, que administra a estrutura, aguarda a análise do TCU e se apega a uma Corte Internacional Arbitral, ou seja, um uma medida extrajudicial independente para definir regras sobre as indenizações pelos investimentos realizados, além de descumprimentos de contrato pela União, segundo a concessionária.

A arbitragem teve as primeiras decisões na última semana. A concessionária fez seis pedidos de reequilibrios contratuais, os quais entende terem sido a principal razão para a crise financeira da estrutura que forçou o processo de relicitação.

Do total dos pedidos, a corte optou pela decisão contrária à concessionária ao extinguir do processo de arbitragem o pedido de Viracopos pelo não recebimento de tarifas cargas em perdimento, que ficam no armazém do aeroporto, e determinou que isso seja acordado entre o aeroporto e a Receita Federal.

O pedido de reequilibrio pela não implementação do Trem de Alta Velocidade também foi negado. Entretanto, a concessionária teve decisão favorável no que considera o tema mais importante da arbitragem, que são as discussões sobre as desapropriações, principal queixa da concessionária para os problemas financeiros.

Anac alega que não reequilibrou o contrato em relação às áreas do aeroporto que não foram desapropriadas porque isso estava condicionado à uma prévia demonstração por parte da concessionária de que aquele espaço seria de fato usado e, além disso, deveria ser provado um “prejuízo financeiro” efetivo com a não desapropriação.

A tese foi negada pela corte arbitral, o que aumenta a possibilidade da Aeroportos Brasil receber um valor por este desequilíbrio no contrato. A corte ainda vai avaliar os pedidos em decisão final.

Além destas questões que tiveram a primeira decisão parcial, há ainda outros três pedidos que aguardam julgamento: reequilíbrio de tarifa de carga aérea, reequilibrio referente à Covid-19 e um terceiro sobre multa aplicada porque a concessionária não entregou as obras no prazo estipulado.

Dois anos de prazo

No dia 14 de junho do ano passado, o governo federal publicou uma resolução que prorroga em dois anos o processo de relicitação de Viracopos. À época, a votação do edital no TCU havia sido retirada de pauta justamente por conta do pedido feito à Anac sobre as indenizações.

A relicitação foi a única a esperança da atual concessionária após a crise financeira que gerou uma dívida de R$ 2,88 bilhões – esse valor é de outorgas vencidas e dívidas com bancos que ainda vão vencer. O débito, inclusive, não está mais sob responsabilidade da concessionária porque foi incluído na arbitragem. O terminal foi o primeiro do Brasil a solicitar a devolução da concessão. O Aeroporto de Natal, em São Gonçalo do Amarante (RN), também passa pelo processo.

Estudos de viabilidade

De acordo com os estudos de viabilidade, o novo contrato para administração de Viracopos, caso realmente haja novo leilão, terá duração de 30 anos, investimentos de R$ 4,2 bilhões, valor total de R$ 13,4 bilhões, construção de segunda pista e o fim das necessidades de desapropriações de áreas para que o complexo aeroportuário seja expandidoO g1 explicou as principais mudanças em quatro pontos principais. Veja aqui.

A relicitação

O último plano de recuperação judicial do aeroporto foi protocolado à Justiça no dia 12 de dezembro de 2019. Desta data até o dia da aprovação, em fevereiro de 2020, Viracopos e os principais credores, entre eles a Anac e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), se reuniram para tentar chegar a um acordo e definiram que a proposta seria votada na assembleia desde que Viracopos aceitasse a relicitação.

Depois de aceita em assembleia, a recuperação judicial de Viracopos foi encerrada pela Justiça no dia 10 de dezembro de 2020. A partir disso, começou o processo de relicitação. Em agosto de 2021, a Anac aprovou o edital da relicitação.

A concessionária já havia sinalizado a intenção de devolver a concessão em julho de 2017, mas emperrou na lei 13.448/2017, que regulamenta as relicitações de concessões aeroportuárias, ferroviárias e rodoviários do Brasil e só teve o decreto publicado em agosto de 2019.

A crise de Viracopos

A crise de Viracopos se agravou na metade de 2017, quando manifestou o interesse da relicitação, mas, por conta da não regulamentação da lei, apostou na recuperação judicial para solucionar a crise. A Aeroportos Brasil protocolou o pedido em 7 de maio de 2018 na 8ª Vara Cível de Campinas. Viracopos também foi o primeiro aeroporto do Brasil a pedir recuperação.

O aeroporto sempre brigou por reequilíbrios no contrato de concessão por parte da Anac. De acordo com a concessionária, a agência descumpriu itens que contribuíram para a perda de receita da estrutura.

A Infraero detém 49% das ações de Viracopos. Os outros 51% são divididos entre a UTC Participações (48,12%), Triunfo Participações (48,12%) e Egis (3,76%), que formam a concessionária. Os investimentos realizados pela Infraero correspondem a R$ 777,3 milhões.

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