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Caso 123milhas: entenda o que foi decidido pela Justiça até agora
Especialistas afirmam que clientes têm chance de recuperar valores perdidos, mas que é preciso ingressar na recuperação judicial
POR JOTA
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(Foto: Agência Brasil)
As sonhadas viagens de férias se tornaram dor de cabeça para clientes da 123milhas, depois que a empresa suspendeu passagens vendidas, entrou em recuperação judicial e viu seus sócios obrigados a prestar esclarecimentos a uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara dos Deputados, além de terem valores milionários bloqueados.
“O principal ponto do caso foi a venda indiscriminada e provavelmente sem a devida programação específica de atendimentos aos consumidores finais, até mesmo podemos supor uma ausência de previsão de variação de custos que a 123milhas viesse a ter”, afirma Fernanda Alves de Oliveira, advogada especialista em processo civil. “Destaca-se também a responsabilidade dos sócios pela gestão temerária dos negócios”, completa.
Especialistas ouvidos pela reportagem afirmam que os clientes, que agora se tornaram credores da empresa, têm chance de recuperar o montante investido, mas precisam estar atentos ao processo e ingressar na recuperação judicial para que consigam recuperar os valores pagos à companhia.
A empresa entrou com o processo de recuperação judicial no fim de agosto. O pedido foi deferido pela juíza Claudia Helena Batista, da 1ª Vara Empresarial da Comarca de Belo Horizonte. Conforme a decisão, a empresa teria 60 dias para apresentar o plano de recuperação judicial completo, que contemplaria a forma de pagamento aos clientes também.
“A recuperação judicial serve, basicamente, para que consumidores prejudicados consigam recuperar ao menos em parte os prejuízos que sofreram, como forma de organizar todas as dívidas da empresa e proporcionar um reparo, ao menos parcial, para todos aqueles que foram lesados pela conduta irresponsável da empresa”, explica Pedro Henrique Costa, advogado e mestre de Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
A relação de credores da 123milhas ultrapassa 700 mil pessoas em um cálculo inicial, dos quais a maioria é consumidor, ainda segundo a decisão.
Dessa forma, a magistrada admitiu a intervenção de todos os órgãos colaboradores que possam informar, mediar, apresentar propostas e fiscalizar as etapas processuais no processamento da recuperação judicial da 123milhas. As dívidas somam R$ 2,3 bilhões.
Em setembro, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) suspendeu provisoriamente a recuperação judicial do grupo, atendendo a um pedido do Banco do Brasil. No entanto, manteve o período de blindagem de 180 dias, em que ficam suspensas as ações ordinárias e execuções contra a sociedade devedora.
Já em outubro, a Justiça também aceitou o pedido da Maxmilhas, que faz parte da holding, e incluiu a empresa no processo.
De acordo com a advogada Lenara Moreira, para cobrar qualquer valor pendente da companhia de viagens, o consumidor deve estar indicado no quadro de credores da 123milhas.
“Quem possui algum tipo de crédito ou valores a serem ressarcidos, é importante que ingresse e se habilite o mais rápido possível na recuperação judicial”, disse.
O advogado Pedro Henrique Costa explica que caso o consumidor tenha valores a receber da empresa, será necessário se habilitar no processo de recuperação judicial, mediante contratação de um advogado, que irá verificar se o crédito do consumidor já foi listado no processo ou se será necessário entrar em contato com o administrador judicial ou mesmo ingressar com um processo autônomo para que seu crédito conste no processo. O especialista alerta, no entanto, que nem sempre é possível recuperar o montante em sua integridade.
“É necessário ter em mente que, em processos de recuperação judicial, os créditos são recebidos com descontos, muitas vezes acima de 50% do valor originário da dívida, e parcelado, de forma que será necessário esperar a aprovação do plano de recuperação para que se tenha certeza dos valores a receber”, disse.
Bloqueio de bens
Além da recuperação judicial, a Justiça bloqueou bens de sócios da 123milhas como forma de garantia. Em setembro, o juiz Eduardo Henrique de Oliveira Ramiro, da 15ª Vara da Comarca de Belo Horizonte, determinou o bloqueio de até R$ 50 milhões em bens e valores em nome de Ramiro Júlio Soares Madureira e Augusto Júlio Soares Madureira, sócios da 123milhas.
Segundo o MPMG, o montante bloqueado corresponde a 1% do faturamento da empresa, considerando-se o valor estimado de R$ 5 bilhões em 2022 e o investimento de R$ 1,118 bilhão no mesmo ano, e tem o objetivo de ser ”garantia mínima para devolução dos recursos investidos pelos consumidores lesados”.
Já na semana passada, o juiz Eduardo Henrique de Oliveira Ramiro, da 15ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte, aumentou o valor do bloqueio de bens dos sócios da agência de viagens online 123milhas de R$ 50 milhões para R$ 900 milhões. Na decisão, o magistrado diz que o novo valor corresponde ao montante de débitos quirografários informado pelas próprias rés nos autos da ação de recuperação judicial.
Além disso, houve ainda discussões acerca do estorno de passagens aéreas e pacotes turísticos comprados pelo cartão de crédito com a 123milhas. No dia 10 deste mês, a Justiça suspendeu os estornos o que, na prática, obrigava os clientes a continuarem pagando pacotes mesmo sem a certeza da viagem, mas seis dias depois a decisão foi derrubada em segunda instância.
“Os valores pagos são passivos listados e não promessas de viagem e qualquer mudança neste formato, como devoluções ou continuidade do pacote são prerrogativas possíveis desde que aprovadas no plano de recuperação judicial”, afirma Luís Alberto de Paiva, economista e especialista em reestruturação financeira de empresas.
Relembre o caso
Em agosto deste ano, a 123milhas informou que iria suspender a comercialização de pacotes e emissão de passagens das viagens com datas flexíveis, que tinham embarques previstos entre setembro e dezembro deste ano.
Os pacotes com datas flexíveis eram o chamariz da companhia. Enquanto os sites das empresas aéreas vendem passagens com até 365 dias, as passagens da linha promo da 123milhas eram vendidas com datas flexíveis para um prazo de 2 anos e oferecendo descontos tentadores.
A ideia, segundo os sócios Ramiro Júlio Soares Madureira e Augusto Júlio Soares Madureira, em depoimento na CPI, era que o mercado de passagens aéreas tivesse uma queda nos preços, o que segundo eles não aconteceu. Ainda segundo eles, a empresa vinha arcando com prejuízo dos primeiros clientes da linha promo, mas com a manutenção dos preços altos das passagens, a empresa decidiu cancelar unilateralmente todos os pacotes já vendidos.
“As práticas se mostraram insustentáveis a longo prazo, por questões internas e do mercado de passagens aéreas, de forma que não é possível a volta dos pacotes promocionais da forma como foram comercializados até recentemente”, diz o especialista Pedro Henrique Costa.
À época, de acordo com 123milhas, os valores pagos pelos clientes seriam integralmente devolvidos em vouchers, com correção monetária de 150% do CDI e que poderiam ser usados por qualquer pessoa para a compra de outros produtos da própria empresa.
O problema é que, logo após, em meio a uma crise de confiança no mercado e a queda acelerada nas vendas, a empresa deixou de pagar o compromisso com os clientes, além de realizar centenas de demissões, o que culminou com o pedido de recuperação judicial.
Vinicius Pereira, repórter freelancer