carregando...

PORTFÓLIO

Bombril em recuperação judicial: como superar a crise e garantir a continuidade operacional?

19 de março, 2025

Por Rafael Coelho e Elias Menegale

A Bombril entrou em recuperação judicial para reestruturar dívidas e garantir sua continuidade

Em 12 de fevereiro de 2025, o Grupo Bombril teve deferido o processamento do seu pedido de recuperação judicial, por meio da decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Regional Empresarial e de Conflitos Relacionados à Arbitragem da Comarca da Capital do Estado de São Paulo, nos autos do processo nº 1000363-92.2025.8.26.0260.

A recuperação judicial envolve todo o Grupo Bombril, composto pelas empresas Bombril, Bril Store, Brilmaq, Bril Cosméticos e BB Logística, cujas plantas industriais estão situadas nas cidades de São Bernardo do Campo (SP), Abreu e Lima (PE) e Sete Lagoas (MG).

De acordo com o Grupo, as causas da crise financeira estão umbilicalmente relacionadas à gestão realizada pelo grupo italiano Cragnotti & Partners, que assumiu o controle das empresas durante os anos 1990 e o início dos anos 2000.

Dentre as situações responsáveis pela atual dificuldade financeira, a companhia destaca a realização de aplicações financeiras consideradas injustificadas, a descapitalização da empresa sem a devida contrapartida e a impossibilidade de manter ativos financeiros necessários à captação de capital de giro, devido à escassez de ativos livres.

Um dos principais fatores que agravaram a situação financeira do Grupo Bombril, a ponto de optar pela recuperação judicial, foi a alteração na estimativa contábil de alguns processos judiciais, especialmente aqueles relacionados à exigibilidade de tributos decorrentes de operações de compra e venda de títulos no exterior realizadas em 1998.

Ressalte-se que a disputa judicial entre a empresa e o Fisco, em razão da falta de recolhimento de tributos incidentes sobre operações de aquisição de títulos de dívida estrangeiros (T-Bills), realizadas entre 1998 e 2001, culminou em decisão favorável à Receita Federal e, consequentemente, no reconhecimento da dívida por parte da empresa, de modo que grande parte da sua receita deverá ser direcionada ao pagamento desses valores.

Esses processos passaram a ser classificados como “prováveis”, o que resultou na reclassificação da contingência tributária e na necessidade de provisionamento de uma quantia substancial. Embora a decisão final sobre a exigibilidade do crédito ainda não tenha sido tomada, essa reclassificação aumentou significativamente o risco financeiro do Grupo, podendo comprometer sua capacidade de continuidade operacional.

Essa reclassificação é ainda mais relevante porque a dívida tributária em questão não está sujeita aos efeitos da recuperação judicial, processo no qual o Grupo Bombril se encontra atualmente. Isso significa que a Fazenda Nacional tem o direito de buscar a cobrança da dívida por meios convencionais, fora do âmbito da recuperação judicial.

A enorme quantia provisionada, por sua vez, coloca em xeque a solvência do Grupo Bombril, afetando diretamente a percepção de seus credores e fornecedores sobre sua capacidade de honrar as obrigações financeiras, o que pode gerar um impacto negativo na confiança do mercado e na estabilidade das relações comerciais.

Além da dívida tributária apontada pela Fazenda Nacional, que já ultrapassa R$ 2,3 bilhões, o edital de convocação publicado em conformidade com o art. 52 da Lei de Recuperação Judicial revela uma relação de credores que totaliza dívidas concursais no valor de R$ 332 milhões.

É certo dizer que as dívidas concursais, que são aquelas sujeitas aos efeitos da recuperação judicial, deverão ser tratadas dentro do procedimento recuperatório, o que implica uma reestruturação das condições de pagamento de forma assertiva.

Sem dúvidas, esse montante de obrigações financeiras extraconcursais agrava ainda mais o cenário econômico do Grupo, tornando imprescindível a elaboração de um plano de recuperação eficaz e viável, que permita superar a crise e garantir a continuidade das operações.

Analiticamente, denota-se que o Grupo Bombril se utiliza da recuperação judicial para alcançar as benesses da Lei Recuperacional, especificamente na busca de mitigar os riscos relacionados à perseguição de seus créditos fiscais.

A medida visa proteger os bens, valores e contratos comerciais ainda em vigor, além de possibilitar uma reestruturação das finanças do Grupo, de modo a garantir a continuidade de suas operações e a recuperação da saúde financeira das empresas envolvidas.

A recuperação judicial, ao fornecer um ambiente de renegociação com os credores e permitir a suspensão de ações judiciais e extrajudiciais, torna-se uma ferramenta crucial para a reabilitação do Grupo Bombril.

Note-se que, com o deferimento do pedido, há suspensão de todas as ações ou execuções contra a empresa devedora relacionadas a créditos sujeitos à recuperação judicial pelo período de 180 dias (stay period), prorrogável por mais 180 dias. Em contrapartida, a empresa não é eximida da cobrança do seu passivo tributário.

Nesse diapasão, embora a recuperação judicial não englobe os débitos tributários, ainda assim, gera um certo impacto positivo na área. Apesar de os débitos tributários continuarem sendo exigidos, o juízo da recuperação judicial pode determinar a substituição de bens penhorados em execuções fiscais, caso sejam essenciais à atividade da empresa, garantindo a aplicação do princípio da preservação da empresa.

Ademais, insta salientar que a empresa pode firmar acordos com a Procuradoria e conseguir descontos nos créditos tributários por meio das transações, conforme as Portarias da PGFN nº 2.382/2021 e nº 6.757/2022. Além disso, melhores condições de pagamento podem ser concedidas para a regularização do passivo fiscal, incluindo o parcelamento da dívida em até 145 parcelas mensais em alguns casos. Também é possível a utilização de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL para liquidar até 70% do saldo remanescente, após a incidência dos descontos.

Dentre as alterações ocorridas na Lei Recuperacional, por meio da Lei nº 14.112/2020, destaca-se a concessão, pelo Fisco, de benefícios fiscais e melhorias nas condições de pagamento para a regularização do passivo fiscal, incluindo o parcelamento da dívida em até 120 parcelas mensais, a possibilidade de utilização de prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa da CSLL para a liquidação de até 30% da dívida consolidada, o estabelecimento de percentuais mínimos a serem aplicados sobre o valor da dívida consolidada, entre outras vantagens.

Assim, recorrer à recuperação judicial mostra-se uma medida cabível e — aparentemente — a única possível para garantir a continuidade das operações de uma companhia tão tradicional como a Bombril, cujos produtos estão indiscutivelmente espalhados pelo país.

A companhia, tão conhecida pelos comerciais de televisão estrelados pelo ator Carlos Moreno, tem uma trajetória consolidada no mercado e uma marca que representa qualidade e confiança para milhões de consumidores.

A realidade financeira pela qual a empresa tem passado demonstra a complexidade de manter operações sustentáveis em um cenário econômico desafiador. A recuperação judicial, portanto, se apresenta como a alternativa necessária para preservar a viabilidade da Bombril, permitindo-lhe reorganizar suas finanças, reestruturar suas dívidas e buscar novas formas de crescimento.

Portanto, a recuperação judicial não é apenas uma solução jurídica, mas um passo fundamental para que a Bombril quite sua dívida fiscal bilionária, mantendo-se como referência no setor de bens de consumo, adaptando-se às novas demandas do mercado e aos desafios econômicos, sem perder sua identidade e relevância no mercado nacional.

Por Rafael Coelho e Elias Menegale, advogados do escritório Paschoini Advogados

https://monitormercantil.com.br/bombril-em-recuperacao-judicial-como-superar-a-crise-e-garantir-a-continuidade-operacional/

Compartilhe