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As decisões do Legislativo e do Judiciário que devem mexer com a vida das empresas em 2024

5 de janeiro, 2024

Temas vão desde inteligência artificial e PL das Fake News até Justiça gratuita e transparência salarial

Por Cristiane Barbieri

(Foto: Fábio Pozzebom/Agência Brasil)

Além de todas as regulamentações específicas ligadas à reforma tributária, uma série de medidas importantes pautadas tanto no Legislativo quanto nos altos escalões do Judiciário deve afetar a vida das empresas neste ano. O Estadão/Broadcast pediu para que advogados destacassem as mais relevantes. Confira abaixo quais as medidas e como devem mexer no dia a dia das empresas:

Transparência salarial

Para tentar eliminar desigualdades salariais entre homens e mulheres, as empresas com mais de 100 funcionários terão de publicar semestralmente um relatório de transparência salarial, a partir de março.

O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) vai elaborar a publicação com base nas informações prestadas pelas empresas no e-Social, bem como nas informações complementares informadas pelas empresas na aba Igualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios, a ser implementada na área do empregador do Portal Emprega Brasil.

Apesar de ainda esperarem regras detalhadas, as empresas estão preocupadas com a privacidade de dados e com aspectos concorrenciais. “Vale lembrar que apenas não publicar o nome do empregado não é suficiente para tornar um dado anônimo”, diz Gabriela Lima Arantes, sócia na área Trabalhista e Previdenciário do TozziniFreire Advogados.

Regulação da internet

O STF deve decidir qual a responsabilidade dos provedores de aplicações de internet (incluindo plataformas de redes sociais) em relação ao conteúdo gerado pelos seus usuários. “A decisão tem o potencial de afetar o modelo de negócio dos provedores e gerar reflexos significativos no regime jurídico da liberdade de informação da coletividade de usuários da rede”, afirma Ciro Torres Freitas, sócio da prática de tecnologia do Pinheiro Neto.

PL das fake news

O Projeto de Lei 2630/2020, também conhecido como “PL das Fake News”, pode voltar à pauta caso haja o mínimo de consenso sobre um texto viável, segundo Brunno Carmona Calado, do Almeida Advogados. A proposta legislativa busca regulamentar a disseminação de informações falsas e manipuladas na internet, especialmente nas redes sociais e serviços de mensagem, com regras rigorosas para regulação e moderação de conteúdo e penalidades para as empresas que não agirem para prevenir práticas ilegais.

“A aprovação deste projeto pode transformar significativamente o cenário para empresas de tecnologia e redes sociais”, dizem André Giachetta e Bárbara Vilela, sócio e associada da prática de tecnologia do Pinheiro Neto. “Elas passariam a ser responsáveis por implementar sistemas de monitoramento e verificação de informações, identificação de contas falsas e remoção célere de conteúdos nocivos compartilhados em suas plataformas.”

Segundo eles, a mudança implicaria em maiores custos operacionais e desafios técnicos, com “investimentos em tecnologias avançadas e possivelmente reestruturação nos modelos de negócios existentes”. “Além disso, a implementação eficaz deste PL iria requerer um delicado equilíbrio para assegurar que as ações contra as fake news não se transformem em ferramentas de supressão de opiniões divergentes ou críticas legítimas”, afirmam.

Inteligência artificial

A regulação de inteligência artificial deve ser discutida no Senado, onde tramita projeto de lei de autoria de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente da Casa, em uma comissão específica para regulamentar seu uso no Brasil.

“As discussões na esfera legislativa podem ser uma oportunidade para construção de uma regulação equilibrada, assegurando a proteção de interesses coletivos e individuais e a promoção de inovação e desenvolvimento tecnológico no País”, afirma Carolina Giovanini, especialista em inteligência artificial no escritório Prado Vidigal Advogados.

Além das normas gerais para o desenvolvimento, implementação e uso responsável de sistemas de IA no Brasil, o PL também prevê sanções aos agentes que não se adequarem a parâmetros de governança previstos na proposta. “O descumprimento dos deveres poderá levar a medidas como advertências, multas (até R$ 50 milhões ou 2% do faturamento do grupo), publicização da infração e exclusão de regime de sandbox, entre outros”, afirma Bruna Borghi Tomé, sócia na área de Tecnologia e Inovação de TozziniFreire Advogados.

Desconsideração da personalidade jurídica

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica permite responsabilizar pessoalmente sócios ou administradores por atos ilegais da empresa, em casos de abuso ou fraude, para proteger credores e cumprir obrigações legais. O julgamento do tema vai definir se cabe ou não desconsiderar a personalidade jurídica, no caso de inexistência de bens penhoráveis e/ou eventual encerramento irregular das atividades da empresa.

“Atualmente, a inexistência de bens, e mesmo em casos de encerramento irregular da empresa, o redirecionamento de execução de dívidas ao sócio, que ocorre por desconsideração da personalidade jurídica, exige identificação de fraude, abuso de direito e confusão patrimonial, o que, por vezes, ainda que se tenham indícios, pode ser difícil aos credores produzir provas”, diz Juliana Maria Raffo, coordenadora da área Cível e de Contratos do Briganti Advogados. “Se o julgamento concluir por essa linha, o atingimento de bens dos sócios por dívidas da empresa pode ter um caminho mais célere aos credores.”

Por outro lado, a mudança pode aumentar a exposição dos sócios às dívidas corporativas, especialmente sem qualquer indício de má-fé, quando houver o encerramento das atividades sem pagamento de credores.

Equiparação de garantias

No mesmo julgamento, será definido se, em ações em que se anulem débitos não-tributários (como multas por infração à legislação administrativa), o seguro-garantia ou fiança bancária podem suspender a exigência de crédito.

“O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu a matéria sob a ótica do direito tributário, registrando que – para fins de suspensão da exigibilidade do crédito – apenas a caução em dinheiro poderá suspender a exigibilidade do crédito”, afirmam os sócios do escritório Mattos Filho Ariane Costa Guimarães, Fabio Teixeira Ozi e Maricí Giannico. “Agora, a Corte é chamada para deliberar se, no âmbito de créditos não-tributários, também há essa exigência.”

Atualização de dívidas civis

Um dos julgamentos mais esperados é o que trata da possibilidade de aplicação da taxa Selic para a correção de dívidas civis, em detrimento do modelo de correção monetária somada aos juros de mora. O debate no Judiciário acontece há cerca de dez anos e há o entendimento de que seria a Selic a taxa para corrigir, mas tem muitos tribunais que usam correção monetária mais 1% de juros de mora ao mês. Portanto, é preciso ter uma definição que traga equilíbrio financeiro nas disputas judiciais.

Atualmente, o processo já tem quatro votos proferidos – dois para cada uma das teses. Como o julgamento foi suspenso duas vezes, em razão de pedidos de vista, regimentalmente esta deverá ser a última interrupção do julgamento.

“O precedente será de muita importância, pois servirá de baliza para as atualizações de todas as dívidas civis e comerciais nos casos previstos pelo artigo 406 do Código Civil”, diz Vicente Araújo, sócio da prática litígios do Pinheiro Neto. O artigo 406 fala de dívidas que não têm juros moratórios convencionados, sem taxa estipulada, ou determinação da lei.

Segundo Mônica Mendonça Costa, sócia na área de Contencioso de TozziniFreire, em termos práticos, a escolha pela Selic ou por um índice de correção monetária mais juros de 1% ao mês “pode implicar em uma enorme diferença no montante final atualizado de débitos – e consequentemente, em um desembolso financeiro maior ou menor para a parte que sofra uma condenação judicial”.

Honorários advocatícios

Em discussão no STF, a pauta trata da possibilidade da fixação dos honorários advocatícios por apreciação equitativa quando os valores da condenação, da causa ou do proveito econômico da demanda forem exorbitantes. A discussão do assunto refere-se a uma decisão do STJ que havia proibido a fixação de honorários por apreciação equitativa em causas de grandes valores.

Fator importante na avaliação de riscos e valores em jogo em uma demanda judicial, os honorários advocatícios sucumbenciais são estabelecidos quando o juiz condena a parte vencida a pagar ao advogado da parte vencedora. Pelo Código de Processo Civil, eles são fixados entre a 10% a 20% do valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.

Ou seja, a parte que “perde” um processo em que se discutia uma dívida de R$ 20 milhões, poderá ver o valor da condenação aumentado em até 20%, considerando o teto máximo dos honorários. Como é um valor devido ao advogado, não à parte, não pode ser objeto de compensação entre credor e devedor, por exemplo.

“Considerando a relevância do tema, o STF reconheceu a repercussão geral de recurso discutindo o tema, para revistar a possibilidade da fixação dos honorários por apreciação equitativa quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem exorbitantes”, afirma Mônica Mendonça Costa, sócia na área de Contencioso de TozziniFreire Advogados.

Justiça gratuita

O julgamento do tema repetitivo 1.178 deve possibilitar a adoção de critérios objetivos para aferir a incapacidade financeira para custear as despesas relacionadas ao acesso à Justiça. “O processo terá impacto significativo no ajuizamento de ações, pois poderá restringir ou alargar o acesso à Justiça”, dizem os sócios do escritório Mattos Filho Ariane Costa Guimarães, Fabio Teixeira Ozi e Maricí Giannico. “Além da necessidade de realizar o pagamento das custas judiciais, as partes deverão arcar com o ônus de sucumbência em caso de perda do processo.”

O relator, ministro do STJ Og Fernandes votou contra a criação de critérios objetivos nessa hipótese. Na sequência, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

https://www.estadao.com.br/economia/pautas-legislativo-judiciario-empresas-2024/

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