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TJSP impõe à Fazenda revisão de classificação fiscal de contribuinte
Rating mais benéfico permite à empresa pedir a apropriação de créditos acumulados de ICMS de forma simplificada
Por Adriana Aguiar — De São Paulo
Uma empresa que tinha sido mal avaliada como contribuinte pelo governo do Estado de São Paulo, no Programa de Estímulo à Conformidade Tributária “Nos Conformes”, conseguiu uma decisão considerada inédita no Tribunal de Justiça paulista (TJSP) para revisar a sua nota. A 8ª Câmara de Direito Público foi unânime ao entender que, ao fazer a classificação, a Secretaria da Fazenda Estadual aplicou critérios não previstos na legislação.
Com uma classificação mais benéfica, na prática, a empresa pode pedir a apropriação de créditos acumulados de ICMS de forma simplificada para abater de débitos do imposto.
A ação foi proposta por uma companhia do setor do agronegócio que, até então, era classificada com A+. Foi rebaixada para a nota D por um atraso de sete dias de uma única Guia de Informação e Apuração do ICMS (GIA).
Esse sistema de notas faz parte do programa “Nos Conformes”, criado pela Lei Complementar nº 1.320, em 2018, para tentar reduzir o número de processos tributários administrativos e judiciais. Os contribuintes são classificados como A+, A, B, C, D, E e NC (aquele que não foi classificado), de acordo com os riscos que oferecem aos cofres públicos.
Quanto mais próximos do A+ terão vantagens como acesso facilitado à renovação de regimes especiais de tributação e o aproveitamento de créditos acumulados simplificado.
Já os enquadrados como D ou E podem ficar obrigados, por exemplo, a fornecer informações periódicas sobre as operações que realiza ou depender de autorização para emitir e escriturar documentos fiscais.
De acordo com o advogado que assessora a companhia, João André Buttini de Moraes, do ButtiniMoraes Advogados, o critério adotado para fazer o rebaixamento da empresa – que seria o descumprimento de obrigações acessórias -, está presente só no Decreto estadual nº 64.453, de 2019 (artigo 2º, parágrafo 6º), que extrapola o que diz a Lei Complementar 1.320.
Ao analisar o caso, a 8ª Câmara manteve sentença a favor da empresa. Nessa sentença, o juiz já havia afirmado que o rebaixamento para a categoria D “parece ofender os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.” Apontou que a lei apenas diz que será classificado na categoria A+ o contribuinte com 98% de aderência (relação entre registro e emissão de notas) e D, quem tiver menos de 90% de aderência.
“Decisão demonstra o compromisso do TJSP com o princípio da legalidade”
— André A. Santos
“Ao considerar o descumprimento da obrigação acessória sem considerar o percentual de aderência (90% ou 98%), o Decreto é contrário à lei”, disse o desembargador Leonel Costa na decisão do TJSP.
Assim, ele suspendeu os efeitos da classificação D, no mês fevereiro de 2023, e determinou que a Fazenda faça a revisão do decidido para observar, exclusivamente, o critério legal no quesito aderência, conforme artigo 8º, parágrafos 1º a 3º da Lei Complementar 1.320 (Processo nº 1040872-75.2023.8.26.0053).
De acordo com Buttini, há outras empresas com notas rebaixadas por critérios do decreto, não previstos em lei. “Esse acórdão foi o primeiro que conseguimos, mas temos outras ações em andamento com sentenças e liminares favoráveis”.
Uma dessas empresas que obteve liminar também foi rebaixada à nota D por atraso maior do que sete dias no recolhimento da GIA. Assessorada por André Buttini, alegou que o atraso diz respeito a uma unidade que não possui atividade, o que não causou prejuízo ao Fisco.
Ao analisar o caso, a juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, destacou: “Tal estabelecimento não apresentou movimentação no período, não havendo motivo para a classificação negativa D, sob pena de ofensa aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade”.
Assim, a magistrada deferiu a liminar e determinou que a Fazenda reclassifique a empresa com nota A+ no Programa Nos Conformes e “se abstenha de criar obstáculos aos pedidos de apropriação de crédito acumulado de ICMS pela Sistemática Simplificada estabelecida pela Portaria SRE 65/2023 até o trânsito em julgado do presente” (Processo nº 1073689-95.2023.8.26.0053).
De acordo com Buttini, essas decisões têm sido importantes ao mostrar que o Judiciário vai fazer esse controle de legalidade dos critérios aplicados. Além da apropriação simplificada de créditos, outras vantagens podem ser oferecidas às empresas que andarem na linha com a fiscalização e tiverem nota A+. Esses benefícios, como a homologação mais célere do ICMS e a monetização do crédito homologado para terceiros, estão previstos no artigo 16 da Lei Complementar, contudo, ainda dependem de regulamentação.
De acordo com o advogado André Henrique Azeredo Santos, do FAS Advogados, o TJSP demonstra o compromisso da Corte com o princípio da legalidade. Ele afirma que essa decisão é a primeira que se tem notícias sobre o tema, mas o tribunal paulista já tem um histórico de respeitar o princípio da legalidade em conflitos entre decretos e leis. Para ele, ainda que caiba recurso aos tribunais superiores, a tendência é que os tribunais não apreciem, uma vez que a discussão aborda leis locais.
“Interessante notar que o tribunal não se intrometeu no trabalho do Fisco de classificar o contribuinte”, afirma o advogado Carlos Eduardo Navarro, do escritório Galvão Villani, Navarro, Zangiácomo e Bardella. “Acertadamente, o que faz a decisão é mandar o Fisco reclassificar o contribuinte levando em consideração a lei e não o decreto, já que o decreto extrapola a lei”.
Navarro afirma que já viu empresas insatisfeitas com a classificação, mas por outros critérios. “Quando alguém simplesmente está insatisfeito, não recomendo ir ao Judiciário, que não irá refazer o trabalho do Fisco”, afirma. Para ele, só vale a pena recorrer à Justiça se for em uma questão como esta, para o Fisco reavaliar observando ou deixando de observar certos requisitos e critérios.
Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa da Procuradoria Geral do Estado informou por nota que “o entendimento do Estado consta já dos autos, não havendo nada de específico ou de mais relevante a acrescentar”. A assessoria da Secretaria da Fazenda de São Paulo não retornou.