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Proposta do PT delimita poderes das Forças Armadas, com despolitização

22 de fevereiro, 2023

Deputados devem apresentar projeto que exclui operação de GLO do artigo 142 da Constituição Federal

Luana Patriolino – Correio Braziliense

(Foto: José Cruz/Agência Brasil)

Brasília – Distorcido pelos bolsonaristas como justificativa para defender uma intervenção militar no país, o artigo 142 da Constituição Federal, que trata do papel das Forças Armadas na sociedade, entrou na mira do governo federal.

Especialistas ouvidos pelo Correio Braziliense/Estado de Minas, defendem que a proposta é positiva, diante a crescente politização dos militares no país desde o governo de Jair Bolsonaro.

A expectativa é que nos próximos dias seja apresentada uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para excluir as chamadas operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) do dispositivo.

O projeto está nas mãos do deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP) e em fase final de preparação. Para a proposição começar a tramitar na Casa, são necessárias 171 assinaturas, ou seja, o apoio de cerca de um terço dos parlamentares.

Apesar de ter sido usado pelos extremistas como “respaldo” para ações golpistas, o caput do artigo 142 não dá margem para interpretação de intervenção militar e diz que “as Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do presidente da República, e destinam-se à defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.

A GLO é uma operação realizada por ordem do presidente da República e deve ser usada em situações graves de perturbação da ordem. Além de excluir o item, outro objetivo do texto é restringir a presença de militares em cargos políticos. Esse item, inclusive, já foi defendido publicamente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que demonstrou incômodo com a participação de oficiais na administração federal.

Na avaliação de Nauê Bernardo de Azevedo, advogado constitucionalista e cientista político, o projeto é bem-vindo para evitar qualquer equívoco a respeito da Constituição. “Tem que riscar essa linha, que é o que o governo do PT parece estar disposto a fazer. Pode ser uma forma muito razoável e interessante de a gente evitar que a política entre nas Forças Armadas e a submeta a essas suspeitas que temos visto ultimamente, que acabam colocando o país inteiro em descrédito”, destaca.

Outra expectativa é que o projeto também restrinja a participação de militares em funções políticas. Nesses casos, eles seriam encaminhados diretamente para a reserva, evitando, assim, o conflito de interesses. “Isso se mostra igualmente positivo. Os militares exercem funções de Estado, e, portanto, sua função não se coaduna com a ocupação de funções políticas junto aos governos de plantão”, defende o advogado Cristiano Vilela, especialista em direito público. 

No entanto, para o advogado Denis Camargo Passerotti, especialista em direito administrativo, o projeto é precipitado. “[A proposta] Se mostra desnecessária e desmedida. O que se tem, na verdade, é o claro intuito de atribuir ao chefe do Executivo a prerrogativa de acionar as Forças Armadas, esvaziar a GLO e proibir que seus membros efetivos participem da política e ocupem cargos públicos, tudo em resposta ao movimento de politização das Forças Armadas ocorrido no governo de Jair Bolsonaro”, argumenta.

O ministro da Defesa, José Múcio, deve se reunir na próxima semana com militares para discutir as propostas que serão apresentadas na Câmara dos Deputados para alterar o artigo 142 da Constituição. O objetivo é mediar o diálogo com os chefes do Exército, Marinha e Aeronáutica e evitar mais desgaste entre o Executivo e os militares — que formaram base aliada da gestão anterior. Uma proposta semelhante já havia sido estudada antes do feriado de 7 de setembro. No entanto, ganhou mais força após os atos de 8 de janeiro. “O que o projeto e as forças democráticas querem é tornar mais claro e referendar que não é possível convocar um poder para intervir. Tem que corrigir essa má leitura”, avalia o cientista político André César, da Hold Assessoria Legislativa. “O momento é este. Depois do 8 de janeiro, ficou mais urgente essa questão”, conclui.

Oficial do Exército critica a medida

O oficial do Exército da reserva Marcelo Pimentel, mestre em ciências militares pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, diz que a proibição da politização das Forças Armadas já é prevista por lei. “Antes de criar legislações, novas normas, ou reformar as existentes, reforçar uma Constituição exige um esforço político enorme, é necessário que se cobre o cumprimento das leis existentes. Existem diversos dispositivos na Lei 6.880/80, que é o estatuto dos militares, que estão sendo descumpridos pelos militares. E o comando das Forças não está exigindo que os militares cumpram essas normas”, argumenta.

Pimentel defende um amadurecimento das propostas antes de serem apresentadas. Para ele, a apresentação de uma PEC é uma medida radical e existem outros meios de impedir a politização das Forças Armadas. “Não precisa mudar a Constituição para isso, basta alterar essas normas infraconstitucionais e também a ação executiva do governo de não empregar as Forças Armadas em operações de Garantia da Lei e da Ordem”, disse. “Além disso, reformar essas normas infralegais é muito mais fácil do que uma PEC — que pode representar, inclusive, desgaste para o governo”, pondera.

Em 8 de janeiro, bolsonaristas extremistas invadiram e depredaram os prédios da Praça dos Três Poderes, por não aceitar a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Diante da situação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decretou intervenção federal para assumir a segurança do Distrito Federal. O governador Ibaneis Rocha (MDB) foi afastado do cargo e Anderson Torres, que respondia pela segurança pública da capital, foi preso.

https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2023/02/22/interna_politica,1460350/proposta-do-pt-delimita-poderes-das-forcas-armadas-com-despolitizacao.shtml

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