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O problema da Uber com a Justiça do Trabalho e as outras plataformas

25 de setembro, 2023

O advogado Alexandre Fragoso Silvestre explica a questão do vínculo trabalhista

Por Jorge Priori

Conversamos com Alexandre Fragoso Silvestre, sócio e responsável pela área trabalhista do escritório Briganti Advogados, sobre o problema da Uber com a Justiça trabalhista, a caracterização do vínculo empregatício de motoristas com a empresa e a possibilidade de esse problema atingir outras plataformas que operam no mesmo modelo da Uber.

De uma forma geral, qual é o problema da Uber com a Justiça do Trabalho?

Esta sentença ocorreu porque o Ministério Público do Trabalho entende que os trabalhadores que se cadastram para prestar serviços para a Uber deveriam ser tratados como empregados CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). Isso porque há muitos trabalhadores que se sentem dessa forma.

Muitos juízes, desembargadores e turmas nos tribunais, inclusive ministros no Tribunal Superior do Trabalho, entendem que há relação de emprego. Outros tantos, não.

A ação coletiva, tal como esta que teve a sentença publicada recentemente, tende a colocar um ponto final nesta discussão, pois ela tem abrangência nacional. É o que chamamos de class action, uma ação coletiva que busca maior pacificação social. Ao invés de milhares de ações do mesmo tipo, a class action busca evitar decisões diferentes para as mesmas situações.

Há como caracterizar vínculo empregatício dos motoristas, que utilizam o aplicativo, com a empresa?

Sim, há. O juiz pontua na sentença, ao longo das suas 96 páginas, que testemunhas ouvidas descreveram o descadastramento, de forma unilateral, por desconexão por longo prazo, com o recadastramento dependendo de requerimento; o descadastramento por recusa recorrente em receber em dinheiro; a existência de avaliações e a gamificação por promoção. São muitos os elementos que indicam poder de punição exercido pela empresa.

O que resta evidente nos autos é que a Uber decide, por intermédio da sua plataforma, quem pode dirigir ou não; impõe as regras para trabalhar; controla, em tempo integral, as atividades dos motoristas; conhece, de forma ampla e irrestrita, tudo o que é feito, como e quando, individualmente, pelos motoristas; tem amplo poder fiscalizatório das atividades dos motoristas e tem poder de punir, de forma média, com o bloqueio unilateral temporário das chamadas e, de forma máxima, com o bloqueio definitivo.

Por outro lado, há quem defenda que o trabalhador escolhe aderir ao tipo de serviço oferecido pela Uber e decide quando, como e onde quer trabalhar, o que afastaria, portanto, a subordinação, que é o tema sensível nesta discussão. Enfim, o tema é de fato complexo, comportando inúmeros entendimentos.

Na sua opinião, isso pode se alastrar para as demais empresas, que assim como a Uber, administram aplicativos que unem contratantes e prestadores de serviços?

Entendo que sim, mas, claro, cada caso é um caso, e esta decisão da Uber pode criar uma tendência, principalmente quando for julgada pelas instâncias superiores.

O que poderia ser feito pelo governo (Executivo, Legislativo e Judiciário) para remediar essa situação?

Em síntese, seria salutar que todos os atores envolvidos nesta relação criassem um amplo debate social, através de consultas públicas, que buscasse o aprofundamento dos estudos, reflexos e consequências de um ou outro caminho a ser trilhado, uma vez que há muitos trabalhadores que conseguem, através destas plataformas, suprir suas necessidades básicas de sobrevivência.

Também há uma grande quantidade de impostos e riquezas geradas, direta e indiretamente, através desta forma de prestação de serviços. Por outro lado, a busca de condições de trabalho mais seguras e com garantias mínimas aos motoristas é um ponto que merece reflexão.

Num outro aspecto deste tema, há vários argumentos sendo apresentados no sentido de assegurar padrões civilizatórios para esta relação existente entre trabalhadores e aplicativos, e que envolve questões relativas à saúde, segurança e proteção social. Também há que se ponderar o seguinte: será que uma decisão desta natureza, determinando o reconhecimento do vínculo de emprego de todos os motoristas, não prejudicaria a viabilidade da Uber como negócio no Brasil?

Os caminhos não são fáceis, mas o assunto é extremamente relevante, importando em ampla reflexão dos poderes Judiciário, Executivo e Legislativo e da sociedade na construção de caminhos sustentáveis para equilibrar o trabalho de um lado e o capital de outro.

Nota: o processo 1001379-33.2021.5.02.0004 tramita na 4ª Vara do Trabalho de São Paulo. Segundo a Uber, a empresa vai recorrer da decisão e não vai adotar nenhuma das medidas elencadas na sentença antes que todos os recursos cabíveis sejam esgotados.

https://monitormercantil.com.br/o-problema-da-uber-com-a-justica-do-trabalho-e-as-outras-plataformas/

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