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PORTFÓLIO

MP 1.171/2023: mudança extrema para taxar investimentos no exterior

26 de maio, 2023

Por Cristiano Vilela e Antonio Borges Neto*

No último dia 30 de abril foi publicada a Medida Provisória 1.171/23, pegando os contribuintes de surpresa, eis que trouxe diversas alterações na legislação do Imposto de Renda, especialmente na tributação de investimentos realizados por pessoas físicas no exterior.

A MP prevê que, a partir de 1º de janeiro de 2024, as pessoas físicas residentes fiscais no Brasil estarão sujeitas à incidência de tributação pelo Imposto de Renda sobre os rendimentos auferidos de aplicações financeiras, lucros e dividendos de entidades controladas e bens e direitos oriundo de trust no exterior.

O objetivo claramente idealizado pelo atual governo federal, foi de aumentar a arrecadação através da taxação de investimentos no exterior, de certa forma para compensar a nova faixa de isenção do Imposto de Renda a ser implementada no País. Não havia atualização da tabela do Imposto de Renda desde julho de 2015, período em que o IPCA acumulado foi de 53,34%.

Outra justificativa do governo petista para a decretação da medida, foi a de seguir recomendação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que estabelece aos países-membros equiparações lineares no âmbito fiscal.

A seguir, traremos nossas considerações sobre os principais pontos da MP 1.171/23.

Os rendimentos auferidos de aplicações financeiras, de controladas no exterior e respectivos ganhos de capital passarão a ser tributados separadamente dos demais rendimentos e ganhos na declaração de Imposto de Renda. Caso a MP 1.171/2023 seja convertida em lei, como foi apresentada, esses rendimentos e ganhos estarão sujeitos à tributação progressiva de 0% para rendimentos anuais inferiores a R$ 6.000,00; 15% para a parcela dos rendimentos superiores a R$ 6.000,00 e inferiores a R$ 50.000,00; e 22,5% para os rendimentos que ultrapassarem R$ 50.000,00.

Os rendimentos auferidos a partir de 1º de janeiro de 2024 em aplicações financeiras no exterior pelas pessoas físicas residentes no país serão tributados sob as alíquotas de 15% a 22,5%, a depender do valor desses rendimentos.

No caso das entidades controladas sediadas em “paraíso fiscal” ou sujeitas a regime fiscal privilegiado ou que tenham majoritariamente renda passiva (i.e. offshore companies), os lucros gerados a partir de 1º de janeiro de 2024 serão tributados ao final de cada ano com base em balaço anual da controlada no exterior, podendo ser deduzidos integralmente os prejuízos apurados após a data de produção de efeitos dessa MP e anteriores à respectiva apuração de lucros. Nesse caso, também poderão ser deduzidos os lucros e dividendos oriundos de empresas investidas que sejam domiciliadas no Brasil.

Importante destacar que essa MP tem o condão de acabar com o benefício do diferimento tributário conferido às estruturas offshore para investimentos financeiros, através do qual os lucros advindos por essas entidades somente seriam tributados no momento de sua efetiva disponibilização à pessoa física residente fiscal no Brasil.

Trusts

O settlor (instituidor) do trust continua sendo tratado como titular dos bens e direitos, até que haja o seu falecimento ou a distribuição para seus beneficiários, todavia, enquanto isso não ocorre, o instituidor estará sujeito à tributação pelo IRPF sobre rendimentos e ganhos de capital relativos aos bens e direitos oriundos do trust.

O beneficiário passará a ser titular dos bens e direitos quando houver a distribuição do trust ao beneficiário (vista como doação) ou no caso do falecimento do instituidor (vista como herança).

Outras disposições

A MP revogou duas isenções, como aquelas aplicáveis aos ganhos de capital para ativos adquiridos no exterior por não residentes e ao ganho de variação cambial em relação aos ativos adquiridos originariamente em moeda estrangeira.

Desta forma, pessoas físicas que possuíam residência fiscal em outros países e, nessa condição, adquiriam ativos no exterior, eram isentas do pagamento de Imposto de Renda no Brasil caso alienassem os referidos bens na condição de residente fiscal no País. Portanto, a nova MP revoga essa isenção, contudo, essa medida somente valerá a partir de 2024, por conta do princípio da anterioridade.

Neste diapasão, a nova legislação autorizou as pessoas físicas brasileiras a atualizarem o valor dos bens e direitos detidos no exterior, mediante a tributação da diferença entre o seu custo histórico e o respectivo valor de mercado em 31/12/2022 pelo IRPF, aplicando-se a alíquota definitiva de 10% (dez por cento). Essa atualização deve ocorrer até 31/05/2023, com pagamento do imposto até 30/11/2023.

No caso de controladas no exterior, a pessoa física que tiver optado pela atualização até 31/12/2022 (na forma descrita acima) também poderá optar pela atualização do valor de mercado em 31/12/2023, com pagamento do IRPF pela alíquota definitiva de 10% até 31/05/2024.

Efeitos da MP

A MP entrou em vigor em 1º de maio de 2023, sendo válida enquanto tramita no Congresso Nacional, mas dependerá de aprovação da Câmara e do Senado para que seja transformada definitivamente em lei, no prazo de 60 dias, prorrogável uma vez por igual período.

A maior parte das alterações da MP 1.171/2023 não terá efeitos imediatos, produzindo efeitos apenas a partir de 1º de janeiro de 2024. Em vista disso, o prazo para que essa análise ocorra será encerrado em meados de setembro, e, durante a tramitação, é possível que alterações sejam implementadas pelos parlamentares.

Caso a Câmara ou o Senado rejeite a MP ou ela perca a eficácia, os congressistas terão de editar um decreto legislativo para disciplinar os efeitos jurídicos gerados durante sua vigência.

Insta salientar que não é a primeira vez que o governo federal tenta tributar os rendimentos auferidos pelas pessoas físicas das entidades controladas offshore, podendo ser citado o Projeto de Lei nº. 2.337/2021 (apelidado de Reforma Tributária do IR), o Projeto de Lei nº. 3.489/2021, a Medida Provisória nº. 627/2013. Entretanto nenhuma delas até o momento teve apoio suficiente para seguir adiante no Congresso Nacional.

Por fim, destacamos a importância de aguardar o andamento da referida MP, para eventual reestruturação dos ativos detidos no exterior.

*Cristiano Vilela, mestre em Direito Constitucional, advogado Sócio do escritório Vilela, Miranda e Aguiar Fernandes Advogados.

*Antonio Borges Neto, mestre em Direito Societário, advogado associado ao escritório Vilela, Miranda e Aguiar Fernandes Advogados.

https://www.estadao.com.br/politica/blog-do-fausto-macedo/mp-1-171-2023-mudanca-extrema-para-taxar-investimentos-no-exterior/

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