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Especialistas veem pontos positivos e negativos em projeto para regulamentar motoristas de app
A regulamentação do trabalho de motoristas por aplicativo, como define o projeto de lei do governo, pode gerar aumento nas tarifas para os consumidores, pois haverá uma elevação dos custos para as plataformas com a obrigação de pagamento do INSS. A avaliação é de Silvia Monteiro, sócia e especialista em direito do trabalho do Urbano Vitalino Advogados.
“Ao meu ver, o projeto é positivo nos aspectos de proteção previdenciária e de um valor mínimo de recebimento. Além disso, auxilia para que as empresas que pretendem investir nessa atividade tenham clareza e segurança, até mesmo para precificar a prestação de serviços, quanto aos custos envolvidos na cadeia produtiva”, comentou.
Entretanto, para a advogada, o projeto deixa a desejar em alguns aspectos. “Deveria ser considerada a hora trabalhada como designada para o pagamento do valor por hora e não a milha rodada, por exemplo. Deveria ser uma fórmula que levasse em consideração a corrida, a distância e a duração”, explicou.
Enquanto o governo tenta regulamentar o trabalho por app, o tema também é pauta nos tribunais. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na semana passada, que o julgamento da Corte sobre a existência de vínculo empregatício de profissionais de aplicativos, como motoristas de Uber, valerá para qualquer caso em qualquer instância, isto é, será de repercussão geral.
O eventual reconhecimento da repercussão geral no Supremo é o primeiro passo para que a Corte produza uma tese vinculante para todo o Judiciário, ou seja, uma decisão que deverá ser seguida por todos os magistrados do país, trabalhistas ou não. Podem ser afetados aplicativos como Rappi, Loggi, Uber, 99, Zé Delivery e iFood, entre outros.
Há ao menos 778 mil pessoas trabalhando no Brasil como motoristas de aplicativo — 52,2% do total de prestadores de serviço em plataformas digitais, isto é, 1,5 milhão de trabalhadores no país, conforme dados divulgados pelo IBGE em outubro.
“Um ponto importante é que essa proposta trata apenas do transporte de passageiros, deixando de lado os trabalhadores de motocicleta, por exemplo, de plataformas de comida como o Rappi e o iFood”, destacou o advogado Ricardo Christophe da Rocha Freire, sócio da área de direito do trabalho do escritório Gasparini, Nogueira de Lima e Barbosa Advogados.
O texto garante que não haverá vínculo à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) nem qualquer relação de exclusividade entre trabalhador e empresa. Freire lembrou que o Supremo já negou o vínculo empregatício em decisões isoladas e disse que a posição vai ao encontro do projeto apresentado pelo governo.
“O PL vai nesse mesmo sentido, de que o motorista de aplicativo não é um empregado e não tem os mesmos direitos de um contrato CLT, pelas características da prestação de serviço e da dinâmica dessas plataformas”, afirmou.
Segundo Paulo Renato Fernandes, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Direito Rio, apesar de “genérica”, a proposta de regulamentação deve dar mais segurança jurídica e previsibilidade ao segmento. Ele destacou, ainda, que uma eventual decisão do Supremo sobre o tema, com repercussão geral, perderá o objeto.
“Nesse sentido, acho que não teria por que seguir com essa pauta. O Supremo estava atuando justamente porque não havia lei. Então, em tese, acabou a discussão. A não ser que alguém ingresse com uma ação declaratória de inconstitucionalidade”, ressaltou.
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