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Em reunião com ministros do G20, economista sugere 2% de imposto anual para super-ricos
Diretor do European Tax Observatory, Gabriel Zucman entregará a Haddad ‘nos próximos meses’ relatório sobre proposta de taxação global para super-ricos; ministro quer comunicado conjunto do G20 sobre o tema até junho
Por Juliana Causin
— São Paulo
(Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil)
Em reunião com ministros de Finanças e chefes de Bancos Centrais do G20 nesta quinta-feira, o economista francês Gabriel Zucman sugeriu um modelo de tributação para super-ricos com alíquota anual de 2% sobre o patrimônio. Um relatório escrito por ele sobre a proposta será entregue ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, nos próximos meses.
— Precisamos garantir que, todos os anos, os bilionários paguem parcela de impostos. A noção de rendimentos dos bilionários pode não ser muito bem definida, por isso esse imposto mínimo deveria ser sobre a riqueza, que é mais bem definida. A proposta concreta é a de que os bilionários paguem ao menos 2% de impostos pela sua riqueza, todos os anos.
Zucman, que é diretor do European Tax Observatory, reforçou a ideia de que o imposto incida sobre a fortuna acumulada dos bilionários e não sobre os ganhos. A estimativa do economista é que a taxação mínima poderia gerar US$ 250 bilhões em receitas, em uma taxação que atingiria cerca de 3 mil pessoas. Ele ponderou, no entanto, que o valor exato da taxa depende “discussão internacional” e que esse é apenas “o início da conversa”.
Ele explicou ainda que o modelo de tributação poderia levar em conta os impostos gerais pagos pelos bilionários e que seria uma espécie de “piso tributário” para os super-ricos – caso um indivíduo, no cômputo geral, pagasse menos de 2% de sua riqueza total em imposto de renda, ele teria que pagar um imposto adicional para atingir essa porcentagem mínima.
‘Desenvolvimento histórico’
Ele ponderou ainda que a discussão é inicial e que uma definição sobre o desenho exato deve ser feita de forma democrática a partir do debate entre os países. Ele também elogiou a proposta brasileira de colocar o tema na mesa do G20. Essa é a primeira vez que o grupo trata do tema.
—Eu realmente acho que é um desenvolvimento histórico — destacou o economista.
Zucman, além de representantes da ONU e da OCDE, participou mais cedo de reunião com autoridades do G20 para apresentar o modelo de tributação de super-ricos, defendido pelo governo brasileiro durante a presidência do grupo de países.
Autor de autor do livro “The Triumph of Injustice” (“O triunfo da Injustiça”, em português), sobre o tema, ele explicou que mantém conversas com o governo brasileiro sobre o tema “há cerca de um ano”.
Mais cedo, na abertura das reuniões de hoje, Haddad pediu cooperação da ONU e OCDE para endereçar o tema e afirmou que pretende construir até junho uma declaração conjunta do G20 sobre a tributação internacional. A proposta não deve aparecer no comunicado a ser divulgado nesta quinta-feira.
Em coletiva de imprensa, Zucman ressaltou que a proposta de taxação para super-ricos poderia começar com uma parcela de países, a partir de cooperações internacionais, e disse que seria “utópico” pensar que existiria um acordo consensual total sobre o tema no mundo.
Ele também ressaltou que é “impossível” pensar em um prazo para que a medida seja adotada, mas destacou que é preciso “avançar o mais rápido possível” nela.
— É importante entender que não precisamos de um consenso global. É possível fazer progressos com a coordenação dos países que estão dispostos a ir nessa direção — afirmou.
Questionado sobre a reação dos ministros sobre a proposta, ele citou como positivo o apoio do ministro de Economia e Finanças da França, Bruno Le Maire, e o interesse da Secretária do Tesouro americana, Janet Yellen.
Imposto global para pessoa física é ‘mais difícil’
Para criar um Imposto Mínimo Global (GMT), a OCDE prevê dois pilares: o Pilar 1 visa distribuir os direitos de tributação sobre os lucros das multinacionais entre os países e o Pilar 2 estabelece uma tributação mínima global para essas empresas globais. A proposta do governo brasileiro é incluir um Pilar 3 voltado para pessoas físicas, como explicou Haddad durante a reunião econômica do G20.
O advogado Eduardo Maneira, sócio do escritório Maneira Advogados e professor Associado de Direito Tributário da UFRJ, lembra que a guerra fiscal para atrair investimentos é “uma realidade da economia globalizada”. Ele avalia que o avanço das trativas da OCDE para atingir pessoas físicas, além de empresas, pode ser “mais difícil”.
— Não é uma tarefa fácil, haja vista a dificuldade de no Brasil e no mundo se instituir o imposto sobre grande fortuna.Um caminho seria o de se levar em consideração onde a renda é gerada e estabelecer uma tributação na fonte do rendimento, deixando de lado a referência da residência da pessoa física.
Mariana Marçal Fragoso, advogada da área de tributos e planejamento patrimonial do Abe Advogados, lembra que o ponto mais desafiador da tributação de bilionários é “evitar a imigração dessas pessoas para outros países e, consequentemente, que todos os seus respectivos investimentos sejam deslocados para outra jurisdição”.