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Dona do Burger King recebe sinal verde da SouthRock para comprar licença da Starbucks no Brasil
A Zamp, que controla a rede de fast food, iniciará diligência nos ativos da marca de cafeterias para confirmar o interesse na aquisição
Por Letycia Cardoso e Juliana Causin
— Rio de Janeiro
(Foto: Divulgação)
A dona do Burger King no Brasil, a Zamp, informou na sexta-feira (19) que apresentou uma proposta para aquisição de bens e direitos das operações do Starbucks no Brasil, a qual foi aceita pelo grupo responsável pela marca, o SouthRock.
De acordo com o comunicado ao mercado, “a companhia iniciará uma diligência nos ativos Starbucks Brasil a fim de confirmar seu interesse na aquisição dos referidos ativos e apresentar uma oferta vinculante”.
Bruno Komura, analista da Potenza Capital, explica que ainda não está claro se a Zamp terá de adquirir alguns imóveis onde as lojas da rede de cafeteria estavam localizadas. Embora ambas tenham sinalizado interesse de fechar negócio, segundo ele, o preço ainda precisa ser acordado.
— Acho que esse acordo é bastante positivo para ambos os lados. A Zamp já tem expertise no varejo e não terá nenhum problema em fazer a operação da Starbucks no Brasil. Por outro lado, a SouthRock buscava alguém que tivesse experiência e uma robustez maior para seguir com a rede no Brasil — avalia.
A aquisição dos Ativos Starbucks Brasil estará sujeita aos procedimentos da recuperação judicial da marca. No processo, iniciado em outubro do ano passado, o grupo SouthRock declara ter R$ 1,8 bilhão em dívidas.
Gabriel Meira, da Valor Investimentos, diz que a proposta tende a ser positiva, visto que a empresa está em recuperação judicial e não teve nenhuma outra oferta. No entanto, pondera que é preciso entender se o valor negociado será suficiente para resolver o problema financeiro da companhia.
— Precisamos entender o detalhe de como vai ser, se vai ser uma fusão, se a proposta será capaz de tirar a empresa da recuperação judicial. Isso não foi ainda divulgado ao mercado — finaliza.
Em relatório, analistas do Bradesco BBI afirmam ter “sentimentos mistos” em relação ao acordo. Eles lembram que as operações do Startbucks Brasil vêm enfrentando dificuldades há alguns anos. O documento cita falta de produtos nas lojas e experiências negativas de clientes. “Preocupamo-nos que as lojas da Starbucks tenham entrado em um ciclo vicioso de experiências ruins”, indica.
Como aspecto positivo, eles citam o fato do Starbucks ser uma das marcas de consumo “mais fortes globalmente”. “Nas mãos certas, a cafeteria pode gerar resultados positivos a longo prazo para a Zamp”, afirmam. Outro ponto forte seria a expansão dos negócios a partir de uma “mentalidade estratégica” do fundo árabe Mubadala, que é dono de 58% das ações da Zamp.
O Bradesco BBI estima que as operações da Starbucks Brasil estejam avaliadas em R$ 250 milhões. Com a consolidação entre as marcas, os analistas projetam um aumento da dívidas da Zamp. A avaliação considera o custo alto da operação da rede de cafés, que conta com 135 lojas em operação no país, incluindo endereços em áreas nobres de capitais, como Rio de Janeiro e São Paulo.
Dúvidas sobre passivos
Nos bastidores, sabe-se que uma das principais preocupações da Mubadala é com a possível vinculação de passivos trabalhistas ou comerciais da Starbucks à exploração dos pontos comerciais, que são considerados um dos ativos mais valiosos da rede de cafeterias. Segundo perícia feita no processo de recuperação judicial, a empresa tinha em junho passado R$ 12,7 milhões a pagar em obrigações sociais e trabalhistas. O valor é três vezes maior do que o registrado em 2020, de R$ 4,8 milhões. O crescimento pode ser resultado da expansão na folha de pagamento, mas também de inadimplência em benefícios e salários, ou de ações trabalhistas.
Pela lei de recuperação judicial, as dívidas que fazem parte do acordo de reestruturação aprovado pela Justiça não são transferidas para o comprador. Carla Calzini, sócia do escritório Briganti Advogados, especialista em Fusões e Aquisições, lembra, no entanto, que os negociadores vão precisar entender a fundo quais passivos do Starbucks entram no acordo.
— Os possíveis compradores vão precisar fazer um estudo aprofundado para entender quais passivos estão incluídos no plano de recuperação judicial. Se não estiver listado no plano, eles precisam entender o valor dessa contingência e se realmente vale a pena fazer algum tipo de negociação para o preço. — afirma a advogada.
Outro ponto sensível na venda é a própria exploração da marca Starbucks. No ano passado, depois do atraso no pagamento de royalties, a Starbucks Coffee International notificou a rescisão de contratos com a SouthRock. Em março, o grupo brasileiro conseguiu ampliar em mais um mês o prazo para explorar a marca de cafés, enquanto negocia a venda das operações da rede.
O processo de recuperação judicial tramita na 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo. Caso a negociação avance, a aquisição vai depender de uma aprovação pela Justiça, lembra Paulo Bardella Caparelli, sócio do escritório Galvão Villani, Navarro, Zangiácomo e Bardella Advogados. Ele destaca que a venda, dentro da recuperação judicial, é uma forma de a empresa proteger a negociação contra possível contestação de credores:
— A lei de recuperação judicial prevê que o ativo, no caso os ativos do Starbucks, poderão ser vendidos sem que os credores peçam a contestação da venda. É uma operação mais segura.
Ações da Zamp subiram 2,2%
Nesta segunda-feira, após o comunicado sobre a possível aquisição do Starbucks, as ações da Zamp subiram 2,28%, negociadas a R$ 3,59. Um dos pontos positivos na avaliação do mercado, para a aquisição, é a sinergia da operação das duas empresas, incluindo pontos de lojas.
— A gente não tem todos os detalhes do contrato para saber quais os termos, mas a avaliação geral é positiva para Zamp, que tem expertise nesse segmento de atuação, e para a Soutrock, que tem possibilidade de se capitalizar durante a recuperação judicial — Carlos Daltozo, analista da Eleven Financial
Alberto Serrentino, fundador da consultoria Varese Retail, concorda que as duas operações trazem sinergias que podem ser benéficas para a Zamp. Ele ressalta, no entanto, o negócio só será benéfico caso o Starbucks, isolado dos problemas da Southrock, se prove de fato sustentável e saudável após as diligências que forem feitas pela Zamp.
— Tudo vai também dos termos de negociação e do que será carregado do passado, incluindo o passivo e as contingências. Outro ponto é o apoio que a matriz da Starbucks vai dar para essa operação e para o que vem depois dela.