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PORTFÓLIO

Computação quântica e o universo jurídico: cruzando a fronteira do amanhã

10 de novembro, 2023

Por Paulo Henrique Fernandes, gerente de Legal Operations do Viseu Advogados

Em um planeta cada vez mais pautado pela tecnologia, o termo “quântico” se desloca das salas de aula de física para o coração das maiores empresas de tecnologia, da mesma forma que o direito se adapta ao avanço constante da sociedade e as suas demandas. Assim como o universo jurídico, que é permeado por interpretações e nuances, o mundo quântico opera de forma multifacetada e complexa. Mas, o que realmente é essa “computação quântica”, e como ela pode vir a ser a próxima grande ferramenta dos juristas?

A computação quântica atua no mundo subatômico, um universo que obedece a regras próprias, bem distintas das que governam nosso cotidiano palpável. Ao invés do padrão binário (0 ou 1), ela utiliza qubits. Estes qubits, graças à superposição, têm a capacidade de representar múltiplas possibilidades simultaneamente. O resultado é um computador quântico capaz de processar uma vastidão de informações simultaneamente, prevendo cenários e desfechos com uma eficácia jamais vista.

Atualmente, a computação quântica está em fases experimentais. No entanto, já se explora sua capacidade de otimizar algoritmos, desenvolver novos materiais e até mesmo acelerar pesquisas de medicamentos, a computação quântica é capaz de simular diversas interações moleculares, e conseguem prever resultados de medicamentos no organismo de indivíduos, bem como a descoberta de novas drogas. Há um horizonte de possibilidades na medicina. Para o direito, imagine analisar décadas de jurisprudências e documentos em minutos, prevendo tendências e desdobramentos, avaliando padrões de distribuição de ação, e sua evolução temporal.

Empresas como Google, IBM e Microsoft já investem nesse campo há anos. O Google, por exemplo, já afirmou ter alcançado a “supremacia quântica”, onde seu computador quântico realizou uma tarefa impossível para os computadores clássicos em tempo hábil, alo que levaria 47 anos para processamento em um computador comum, é processado em 6 segundos por computação quântica. Ademais, a própria Google já lançou uma nova versão, 241 milhões de vezes mais rápido do que seu próprio computador quântico lançado em 2019! Essas empresas estão explorando desde simulações químicas até otimização de portfólios financeiros em seus protótipos quânticos.

Apesar de pouco viável a curto e médio prazo para utilização doméstica, e por pessoas físicas, a velocidade e capacidade de processamento quântico podem auxiliar grandes corporações, sobretudo governos inteiros a otimizar fluxos de forma macro. No judiciário, por exemplo, pode auxiliar na análise de contratos, verificações de conformidade, pesquisas de propriedade intelectual e até mesmo em previsões de litígios, identificação de padrões de advocacia predatória, e diversas associações que seriam impossíveis de serem realizadas manualmente, e de forma rápida. O Judiciário poderá ter sua eficiência aumentada, economizando tempo e alto volume de recursos.

Cabe ressaltar que a computação quântica não é uma nova onda que irá suprimir, por exemplo, a inteligência artificial generativa, que têm ocupados as páginas dos principais jornais e blogs, nas mais diversas áreas. Na verdade, a computação quântica e a IA são mais aliadas do que concorrentes. Enquanto a inteligência artificial se dedica a aprender, interpretar e criar soluções a partir dos dados fornecidos, a computação quântica pode ampliar exponencialmente a velocidade e capacidade desse processamento. Isso significa que, quando combinadas, a computação quântica tem o potencial de potencializar a IA, permitindo que ela processe, analise e aprenda com volumes de dados antes impensáveis em tempos recordes. Juntas, essas tecnologias podem criar uma simbiose que revoluciona a forma como interpretamos e utilizamos grandes massas de informação. Devemos ressaltar que são gerados atualmente, cerca de 2.5 quintilhões de bites de dados diariamente, e desse total, apenas 20% são processados por algum algoritmo. Por meio da computação quântica, podemos finalmente acelerar esse processamento, potencializando o avanço da IA como a conhecemos hoje, bem como o surgimento de novas formas de IA.

Apesar do potencial, a computação quântica ainda é suscetível a erros devido a interferências externas. Não surpreendentemente, dois dos maiores bancos privados do país em parceria com universidades e hubs de inovação, firmaram parceria com a IBM para utilização dos computadores quânticos para estudos. A maior preocupação dessas instituições é buscar meios de aperfeiçoar a segurança dos seus sistemas bancários, algo claramente ameaçado com a amplificação dessa tecnologia. O motivo? A computação quântica representa também um desafio de segurança: a criptografia atual pode ser altamente vulnerável aos computadores quânticos, algo que até então era considerado moderno e seguro, pode estar ameaçado. Aqui, o direito terá um papel essencial na proteção de dados, na regulamentação das novas tecnologias e a criação de mecanismos para conter os possíveis efeitos negativos dessa inovação.

A computação quântica não é mais mero tema de ficção. Ela é real, está em evolução e tem o potencial de redefinir diversos setores, incluindo o jurídico. A digitalização dos processos promovida pelo judiciário na última década gerou uma grande massa de dados que pode não só gerar grandes análises históricas, como demonstrar padrões que passaram despercebidas pelo judiciário até então, e promover mudanças significativas nessa área. Cabe a nós, profissionais do direito, nos atualizarmos e guiarmos os novos paradigmas que essa tecnologia trará consigo, garantindo que o direito caminhe lado a lado com a inovação, regulando e protegendo a sociedade rumo a esse futuro que já é presente.

Paulo Henrique Fernandes é Legal Ops Manager no Viseu Advogados, pós-raduado em Direito Civil e Direito do Consumidor pela Escola Paulista de Direito, certificado em Tecnologias Emergentes, Inteligência Artificial e Métodos Ágeis pela IBM, além de membro da CLOB (Comunidade Legal Operations Brasil) e da CLOC (Corporate Legal Operations Consortium).

https://analise.com/opiniao/computacao-quantica-e-o-universo-juridico-cruzando-a-fronteira-do-amanha

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