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Com dívidas, agência de turismo Hurb tenta reabrir crédito

28 de abril, 2023

As pendências em atraso dos últimos 45 dias somam R$ 50 milhões, dos quais R$ 15 milhões são com hotéis; para os próximos 45 dias, o montante a vencer é de R$ 90 milhões

Por Cristian Favaro e Fernanda Guimarães, Valor — São Paulo

Após o afastamento do fundador e executivo-chefe (CEO) João Ricardo Mendes na última segunda-feira, a agência de viagens on-line Hurb, ex- Hotel Urbano, está na berlinda. O caixa encolheu, a torneira de crédito fechou e muitos dos consumidores que compraram viagens da empresa não conseguem viajar. As pendências em atraso dos últimos 45 dias somam R$ 50 milhões, dos quais R$ 15 milhões são com hotéis. Para os próximos 45 dias, o montante a vencer é de R$ 90 milhões, informou a Hurb ao Valor.

A falta de caixa levou ao não pagamento de hotéis e se transformou em uma bola de neve. As redes hoteleiras passaram a negar novas reservas da empresa e até a cancelar as já agendadas, piorando a situação dos consumidores que já tinham comprado viagens. Clientes insatisfeitos passaram as últimas semanas criticando a empresa nas redes sociais, o que que colocou os holofotes sobre a situação financeira da companhia.

“Com a questão de caixa devido à crise de crédito, a empresa buscou priorizar o viajante e, portanto, alguns parceiros foram impactados pelo atraso de pagamento”, disse a empresa, em nota, referindo-se aos pagamentos em atraso.

A empresa está com dificuldade de resgatar seus recebíveis (receitas que ainda vai receber) junto a bancos — modalidade de crédito que permite a obtenção de capital de giro. A Hurb informa que tem cerca de R$ 860 milhões em recebíveis e “que está em contato com instituições financeiras na tentativa de reverter a situação”. Segundo a empresa, o o banco Itaú suspendeu os adiantamentos de recebíveis diante do risco da carteira. Procurado, o Itaú não se pronunciou.

De acordo com fontes, até meados do ano passado a Hurb tinha vendido cerca de R$ 2 bilhões em viagens acumuladas.

Historicamente, os bancos liberam cerca de 70% do valor pedido quando se trata de antecipação de recebíveis atrelados a pacotes turísticos. A razão é uma característica desse segmento: há sempre o risco do turista cancelar a viagem e, assim, suspender o pagamento.

A taxa de 70% pode ser menor, dependendo da empresa e dos riscos embutidos na operação, disse uma fonte. E por contrato, as instituições financeiras não são obrigadas a fazer antecipações.

No caso da Hurb, como a relação com os clientes se tornou conflituosa e os cancelamentos cresciam, essa torneira de crédito minguou, dado que o risco aumentou. Com isso, o “caixa” que a empresa diz ter, no fim, poderia desaparecer diante de uma onda de cancelamentos batendo à porta.

Uma fonte no setor financeiro observou que a alternativa da empresa seria transferir a carteira para outra instituição, mas o elevado risco tornaria esse movimento mais complicado.

A situação da Hurb chamou atenção dos órgãos de defesa do consumidor. A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) abriu processo administrativo e na noite desta quinta-feira (27) deu 48 horas para que a empresa comprove que tem recursos para honrar a execução dos pacotes que continua vendendo. Se a medida não for cumprida, as vendas podem ser suspensas. O Procon do Rio também questionou a Hurb na terça-feira. A empresa tem 15 dias para apresentar sua defesa.

A Hurb informa, em anúncio publicado nesta sexta-feira, que contratou a consultoria Corporate Consulting para “resolver todas as pendências”. Segundo a agência de viagens, o CEO da consultoria, Luiz Alberto Paiva, “está envolvido diretamente nessa operação”. A Hurb também informa que sob o comando do novo CEO, Otávio Brissant, que trabalha na empresa há sete anos e estava dirigindo as áreas jurídica e de pessoas, “a regularização dos pagamentos dos parceiros” já foi iniciada.

A Hurb ganhou fama ao vender pacotes turísticos com datas muito distantes, na casa de dois anos, e preços bastante atrativos. “Se as condições de preço se mantiverem estáveis, o negócio fica linear. Mas não foi o que aconteceu, com os preços das passagens aéreas e hotéis disparando”, disse uma fonte que acompanha de perto a empresa. A Hurb, então, passou a depender da margem de novas vendas para honrar os compromissos do passado, mas nas últimas semanas a crise se agravou, com Mendes insultando e expondo dados de um cliente em um grupo de WhatsApp. Em um vídeo, também ironiza queixas de consumidores.

A Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (Abih), que representa hoteleiros independentes, tem sinalizado um momento difícil na relação entre o setor e a Hurb. Embora apoie o modelo de negócio, que ajudaria hotéis a atrair turistas em épocas de baixa demanda, a Abih de Santa Catarina orientou os associados a não receber novas reservas da Hurb e pediu que clientes com reservas procurem os hotéis separadamente.

Em São Paulo, a Abih local informou que orienta os hotéis para que recebam todos os clientes, mas observa que muitos optam por recusar novas reservas. “Tínhamos uma reunião marcada para segunda-feira passada, mas ela não aconteceu diante da saída do CEO. A estimativa é que na próxima semana a gente consiga se reunir com a empresa”, disse Ricardo Roman, presidente da Abih-SP.

Assim como em São Paulo, a Abih de Santa Catarina apontou atrasos nos pagamentos aos hoteleiros de três a quatro meses por parte do Hurb. “Fomos procurados por diversos associados acerca do Hurb”, disse Rui Schürmann, presidente da Abih catarinense. “Temos empresários que estão entrando com ação na justiça para receber”, acrescentou.

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2023/04/27/aps-sada-do-ceo-agncia-de-turismo-hurb-acumula-pagamentos-em-atraso-e-tenta-reabrir-torneira-de-crdito.ghtml

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