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A reforma tributária foi promulgada. E agora?
Período de transição para o novo sistema se inicia em 2026, mas reforma ainda depende da redação de leis que vão regulamentar as alterações aprovadas pelo Congresso
POR JOTA
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Sessão solene do Congresso Nacional para promulgar a reforma tributária, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
O presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), promulgou nesta quarta-feira (20) a Emenda Constitucional 132, da reforma tributária.
O ato realizado em evento que contou com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, dentre outros políticos, declarou a existência da nova norma que reformula o sistema de tributos no Brasil e ordenou sua execução.
Segundo especialistas consultados pela reportagem, o objetivo da reforma é simplificar o complexo sistema tributário brasileiro. Mas, para isso, ainda é necessário redigir leis que regulamentem a mudança e que haja um período suficiente de estudo para avaliar os impactos das alterações.
“Ainda que a reforma não seja perfeita e tenha muitos pontos pendentes de ajustes, especialmente quando for o momento da edição de leis complementares, não se pode negar que a simplificação do sistema é de suma importância para atrair novos investimentos no Brasil, sem contar que trará mais facilidade e otimização do tempo despendido pelos contribuintes na compreensão da sistemática tributária”, avalia Marina Chaves, advogada especialista em Direito Tributário.
O texto que deu origem à reforma foi a PEC 45/2019, iniciada na Câmara dos Deputados e aprovada, pela primeira vez, em julho. Remetida ao Senado, que a aprovou com alterações, em novembro, a proposta voltou à Câmara, que fez nova votação na semana passada e aprovou a versão final do texto.
Dentre os principais pontos, o texto aprovado simplifica impostos sobre o consumo em um único, o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual. Os impostos federais (PIS, Cofins e IPI) serão substituídos pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), enquanto o ICMS (estadual) e ISS (municipal) serão substituídos pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) ainda terá sobrevida e será cobrado sobre os produtos que concorrem com aqueles fabricados na Zona Franca de Manaus.
Haverá ainda um outro imposto, chamado de Imposto Seletivo (IS), que será federal e incidirá somente sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde da população ou ao meio ambiente (como cigarros, combustíveis e bebidas alcoólicas). Por isso, ficou conhecido como ‘imposto do pecado’. O tributo, no entanto, não incidirá na exportação ou sobre bens e serviços que contam com redução de alíquotas.
Reforma finalizada?
Apesar da promulgação, de acordo com o secretário extraordinário da reforma, Bernard Appy, ainda faltam leis complementares (LCs) e ordinárias que complementam o projeto, principalmente em relação a três pontos: sobre as alíquotas do IBS, do CBS e os regimes diferenciados e transição; outra sobre o comitê gestor, que irá auxiliar na gestão do CBS; e uma sobre o IS, que incidirá sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio-ambiente.
Com a promulgação da reforma, o governo tem prazo de 180 dias para enviar as LCs ao Legislativo.“O texto aprovado é apenas uma amostra de como será o novo sistema tributário do país. É
necessário que sejam criadas leis complementares e regulamentações pelos órgãos públicos, de modo que a partir daí será possível afirmar com mais certeza as melhorias e as problemáticas advindas desse novo sistema”, afirma Marina Chaves.
Para o advogado tributarista Rodrigo Antonio Dias, no entanto, será necessária atenção às negociações acerca dessas novas legislações.
“O jogo começa agora. Após a promulgação é que passaremos a discutir as leis complementares, leis ordinárias, etc. Ou seja, é a partir de agora que vamos discutir as alíquotas, a forma de pagamento e o creditamento dos tributos. Esses são os pontos mais importantes para atendermos os princípios anunciados pela reforma tributária. São detalhes que devem ser muito bem trabalhados e observados para não desviarmos do objetivo de termos um sistema tributário mais inteligente, simples, transparente e eficaz”, disse.
Impacto da reforma tributária?
Para além da simplificação tributária para empresas, a reforma terá três pontos que vão impactar diretamente a vida do cidadão comum. Para Salvador Cândido Brandão Jr., professor de direito tributário no Programa de Pós-Graduação da FGV-SP (GV-Law), o primeiro se refere ao cashback, ou seja, de devolução dos tributos pagos a famílias de baixa renda.
Outro ponto é o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), de competência estadual, que passará a ser progressivo, de acordo com o valor do bem doado/herdado e também irá incidir sobre herança no exterior.
Além disso, o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) passará a incidir também sobre jatinhos, iates e lanchas. O texto abre a possibilidade de o imposto ser progressivo em razão do impacto ambiental do veículo, mas continuará sendo de competência estadual.
“O cidadão comum deve ter impactos diretos em ITCMD e IPVA, além de impactos nos valores dos serviços, pois ainda estão pendente de ajustes sobre a alíquota a ser aplicada. Além disso, a operacionalização do cashback tampouco é conhecida, o que pode trazer problemas iniciais na implementação e alcance aos cidadãos que precisam dessa ferramenta como forma de justiça fiscal”, explica o professor.
As mudanças, entretanto, não são imediatadas. O período de transição entre os sistemas tributários será de sete anos, entre 2026 e 2032. “A transição será gradativa e permitirá aos contribuintes testarem cada etapa do novo sistema, sem que o anterior seja integral e automaticamente descontinuado”, afirma Salvador Cândido Brandão Jr.
A tributação do IBS/CBS tem início em 2026, com uma alíquota teste de 0,9%, a qual aumenta ano a ano e, em contrapartida, diminui a dos atuais tributos (PIS/COFINS, IPI, ICMS, ISS). Já o PIS/COFINS será extinto em 2027, extinguindo-se no mesmo momento o PIS/COFINS, passando a existir a cobrança da CBS e do imposto seletivo.
Além disso, a transição prossegue para o ICMS e ISS, diminuindo ano a ano, até que estejam extintos em 2033, passando a existir a incidência única e plena do IBS.
Vinícius Pereira, repórter freelancer do JOTA