carregando...

PORTFÓLIO

123milhas entra com pedido de recuperação judicial para impedir execução de R$ 2,3 bilhões em dívidas

29 de agosto, 2023

Empresa pede que ações de cobrança sejam suspensas de forma imediata por um período inicial de 180 dias

Por Letycia Cardoso — Rio de Janeiro

(Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil)

A 123milhas entrou, na tarde desta terça-feira, com pedido de recuperação judicial em tutela de urgência por meio da 1ª Vara Empresarial de Belo Horizonte. A informação foi antecipada pelo colunista Lauro Jardim. A solicitação é que todos os processos de cobrança movidos contra a empresa sejam suspensos de forma imediata, por um período inicial de 180 dias.

De acordo com a ação, o valor inicial da dívida informado é de mais de R$ 2,3 bilhões.

Nathalia Ribeiro, coordenadora da área Contencioso Empresarial e Arbitragem do Allaw Advogados, explica que, agora, o juiz irá analisar o pedido a fim de autorizar ou não o processamento da recuperação judicial, determinando a suspensão das ações e execuções que levem à penhora de bens. Embora esse recurso seja uma alternativa para evitar que a empresa quebre, não há nenhuma previsão de quando os compradores de pacotes poderão ter acesso novamente aos valores investidos.

— Os créditos dos consumidores vão estar sujeitos às condições de pagamento que serão votadas no plano de recuperação judicial, que envolvem um deságio, um período de carência e um período de parcelamento — comenta.

Nessa segunda, a companhia fez uma demissão em massa em seu quadro de colaboradores e informou à imprensa que estava “trabalhando para, progressivamente, estabilizar sua condição financeira”.

Mais de 5 milhões de clientes

No pedido de recuperação judicial, que também envolve as subsidiárias Novum e Art Viagens, a 123milhas disse que atende cerca de 5 milhões clientes por ano e que emprega 309 funcionários diretamente e outras centenas indiretamente.

A companhia ainda se apresentou como um dos dez maiores websites brasileiros de comércio eletrônico, conseguindo movimentar, após “intensa estratégia de marketing” R$ 6,1 bilhões em 2022, se tornando uma das maiores agências on-line de viagens (OTAs -Online Travel Agency, em inglês) do Brasil.

O documento ainda esclarece que a 123milhas esperava que os clientes que comprassem passagens flexíveis, sem data específica, a preços mais baixos que os praticados no mercado, se fidelizassem à empresa e adquirissem serviços acessórios, tornando a venda vantajosa.

A “123milhas reconhece que os resultados previstos mediante estudos preparatórios do Programa Promo123 acabaram não sendo atingidos, porque, por exemplo, se acreditava que para cada voo vendido, o cliente também adquiriria outros produtos atrelados à viagem (reservas de hospedagem, passeios etc.), mas isso acabou não ocorrendo na prática. Ainda, pode-se notar que o cliente do produto Promo123 é diferente dos demais clientes da companhia, uma vez que apenas 5% dos clientes frequentes da 123milhas efetivamente compraram os produtos do Programa Promo123, percentual muito inferior ao previsto e que impediu a efetivação do cross sell esperado”, argumentou.

A empresa ainda admitiu que, em tal contexto, “se viu impossibilitada de emitir as passagens aéreas, pacotes de viagem e os seguros adquiridos pelos clientes do Programa Promo123, especialmente nos prazos contratados”, optando por tirar o Programa Promo123 do ar e entrar com pedido de Recuperação Judicial para cumprir tais obrigações de forma organizada”.

Lembre o caso

Pouco mais de uma semana atrás, a agência on-line de turismo anunciou a suspensão de bilhetes de pacotes flexíveis da sua linha Promo, com previsão de embarque entre setembro e dezembro. A medida decepcionou inúmeros clientes, já que muitos tinham reservado e quitado hospedagens e passeios nos destinos pretendidos.

O fato levou Procons do Rio de Janeiro e de São Paulo a cobrarem explicações da companhia, assim como os Ministérios da Justiça e do Turismo.

Ao contrário do que determina o Código de Defesa do Consumidor, a 123milhas não ofereceu a possibilidade de os clientes escolherem como desejariam ser recompensados: através de cumprimento forçado imediato, recebimento de produto ou serviço semelhante ou devolução de dinheiro com correção monetária. A empresa simplesmente informou aos consumidores que eles iriam receber um voucher para uso na própria plataforma em até 36 meses.

De acordo com a advogada Luciana Atheniense, algumas das pessoas representadas por ela receberam “vouchers picados”. Em um dos casos, uma compra de uma viagem de R$ 2 mil foi devolvida em quatro vales de R$ 500, que não poderiam ser usados juntos. A medida, segundo ela, desrespeita toda a legislação de direitos dos consumidores.

Na ação, a 123milhas alega enfrentar uma crise “momentânea e pontual” e destaca que a “liberação de recursos eventualmente penhorados em contas e aplicações financeiras” tem importância econômica e social “para ajudar a manter o regular funcionamento da economia brasileira”.

O advogado especializado em direito do consumidor e diretor jurídico do Instituto Brasileiro de Cidadania, Gabriel de Britto Silva, aponta que, em caso de falência, a prioridade de pagamentos é dos trabalhadores, depois dos credores com garantias reais —normalmente bancos — e, por fim, dos credores quirografários, grupo que inclui consumidores e fornecedores.

— O ônus do revés de um negócio deveria ser suportado pelo fornecedor, jamais pelo consumidor vulnerável e hipossuficiente — avalia. — Era indiscutível que tal produto, base do sucesso da 123milhas, não era rentável. Em verdade, quem pagava as passagens dos que hoje viajariam eram consumidores que pagavam suas passagens para viajar daqui a dois ou três anos.

Em nota enviada ao GLOBO, a empresa informou que o pedido de recuperação judicial “tem como objetivo assegurar o cumprimento dos compromissos assumidos com clientes, ex-colaboradores e fornecedores”. Além disso, ao concentrar em um só juízo todos os valores devidos, a empresa avalia que chegará mais rápido a soluções com todos os credores para reequilibrar sua situação financeira.

https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2023/08/29/123milhas-entra-em-recuperacao-judicial-e-pede-suspensao-das-dividas-por-180-dias.ghtml

Compartilhe