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Por falta de descrição dos atos supostamente criminosos, TRF-3 tranca ação
Foto: IA
A denúncia formalizada pelo Ministério Público deve sempre expor o fato em tese criminoso com todas as suas circunstâncias, além de qualificar o acusado ou fazer esclarecimentos que possam viabilizar a ampla defesa e o contraditório. Com esse entendimento, a 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região trancou uma ação penal em relação a uma mulher acusada de integrar uma organização criminosa (orcrim) apenas por ter sido proprietária de duas das empresas supostamente usadas para receber depósitos de outro réu.
Os desembargadores fizeram a ressalva de que a decisão não impede o Ministério Público Federal de oferecer uma nova denúncia com a descrição completa de supostos atos criminosos cometidos pela mulher.
Na denúncia, o MPF apontou supostos desvios de repasses federais para combate à Covid-19 no Guarujá (SP). A mulher foi acusada do delito de organização criminosa por supostamente ter obtido ganhos financeiros com contratos públicos angariados de forma ilícita por outros réus.
A 5ª Vara Federal de Santos (SP) recebeu a denúncia. Em seguida, a defesa da mulher, feita pelo escritório Wilton Gomes Advogados, apresentou um Habeas Corpus ao TRF-3 e alegou que o MPF não apontou a verdadeira finalidade da orcrim.
Segundo os advogados, a petição inicial não narrou as acusações de forma clara e pormenorizada, o que impossibilitou o contraditório e a ampla defesa. O nome da mulher apareceu em um único parágrafo entre a 27 folhas da denúncia.
Para a defesa, ela foi acusada apenas por ter sido sócia de duas empresas do ramo medicinal que fizeram negócios com companhias de propriedade de outro réu. Este, por sua vez, teria pago propinas ao prefeito do Guarujá em troca de contratos públicos na área da saúde.
Por outro lado, em nenhum momento o MPF apontou a posição ocupada pela acusada no grupo criminoso; indícios de “estabilidade e hierarquização” na organização; como ela saberia dos fatos atribuídos ao outro réu; ou o motivo pelo qual ela poderia ser responsabilizada por eles mesmo se soubesse.
Os advogados ainda alegaram que a Vara de Santos violou o Código de Processo Penal, pois constatou a inépcia da denúncia, mas, em vez de rejeitá-la, determinou seu aditamento.
Por fim, argumentaram que nem mesmo o aditamento à petição inicial apontou qualquer situação possível de enquadramento no crime de organização criminosa.
O desembargador Hélio Nogueira, relator do caso, concordou que a denúncia não expôs os fatos com todas as suas circunstâncias em relação à mulher.
Segundo ele, o MPF se limitou a descrever a posição dela como sócia das empresas que teriam recebido remessas milionárias, sem “detalhamento mínimo” da sua atuação no contexto dos delitos.
“A narrativa é genérica, sem indicação clara da imputação feita à paciente”, concluiu. O magistrado acrescentou que a “deficiência” na acusação inviabiliza “o pleno exercício do direito de defesa”.
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Processo 5004552-24.2025.4.03.0000