PORTFÓLIO

Mercosul avança na integração de identificação digital
Mercosul avança na integração de identificação digital
Medida vai facilitar acesso a serviços públicos entre países do bloco
Por Ruan Amorim — De Brasília
(Foto: Isac Nobrega/PR)
Os países do Mercosul avançaram em um consenso para integrar seus sistemas de identificação digital. A ideia é que haja reconhecimento mútuo das identidades digitais dos cidadãos dos Estados-membros, permitindo que eles acessem serviços públicos de forma mais ágil nos países do bloco.
O entendimento sobre a integração ficou registrado na “Declaração de Altas Autoridades sobre Identificação Digital no Mercosul”, assinada na quinta-feira (18) pelos Estados durante o webinário sobre identificação digital.
De acordo com o secretário de Governo Digital do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), Rogério Mascarenhas, com a integração, quando uma pessoa está em outro país e precisa acessar um serviço público, mas não possui “CPF” local, necessário para algumas operações, o sistema permite o reconhecimento de sua identidade, facilitando o acesso aos serviços.
“Então, na verdade, é um avanço para flexibilizar e possibilitar, de forma segura, esse processo de identificação e integração para acesso a serviços públicos, que são, obviamente, escolhidos ou habilitados pelo país que presta o serviço”, disse.
Após o entendimento para avançar na agenda de integração digital, o segundo passo, segundo o secretário, é que cada país defina quais serviços estarão disponíveis para acesso por meio do sistema integrado.
Além disso, cada Estado precisa assinar um acordo formal de reconhecimento da autenticação digital. O documento deve ser aprovado pelo Congresso de cada nação para ter validade legal, garantindo a efetividade da integração.
Para o uso do sistema, é necessário que cada pessoa utilize o seu nível mais alto de segurança na identificação do sistema de seu país, como o nível ouro no caso do GOV.BR. Além disso, todos os países precisam obrigatoriamente ter uma legislação sobre proteção de dados.
A ideia de reconhecimento mútuo de meios de autenticação e identificação digital entre os Estados-membros do Mercosul surgiu após um projeto-piloto desenvolvido entre Brasil e Uruguai no ano passado.
De acordo com o diretor do departamento de Identidade Digital do MGI, Hudson Vinícius Mesquita, a iniciativa permitiu que representantes de empresas brasileiras utilizassem sua conta GOV.BR para acessar serviços públicos do Uruguai.
“Nesse caso, você pode usar sua conta GOV.BR para acessar o portal do Uruguai, utilizando seu CPF e senha, da mesma forma que faz para acessar serviços do MEC, da Receita ou do INSS no Brasil”, disse o diretor.
Para isso, Mesquita explica que foi necessário o Uruguai adaptar os seus sistemas para reconhecer a identidade digital brasileira nos seus serviços. Ele detalhou que o país vizinho testou o modelo durante um período, avaliou e fez os ajustes necessários.
“O que a gente fez agora foi o caminho inverso, com a plataforma GOV.BR, que tem várias formas de acesso. Pode-se usar banco, certificado digital e agora também aceitamos uma identidade do Uruguai, porque temos a capacidade de reconhecer essa identidade como meio de acesso ao serviço”, ressaltou Mesquita.
O acordo possibilitou aos brasileiros acesso totalmente digital a 36 serviços da Agência Reguladora de Energia e Água (Ursea) do país vizinho, beneficiando fabricantes ou importadores.
Entre os serviços disponíveis, está a “Autorização do rótulo de eficiência energética”, que permite que fabricantes ou importadores comercializem no país produtos como lâmpadas fluorescentes compactas, dispositivos elétricos de refrigeração para uso doméstico, aparelhos de ar-condicionado e bombas de calor para uso doméstico ou similar.
Para o advogado Renato Chiappim, head da Área Cível do escritório Paschoini Advogados, o reconhecimento mútuo das identidades digitais tem o potencial de simplificar substancialmente a relação entre cidadãos, empresas e governos. Hoje, segundo ele, um estrangeiro muitas vezes precisa recorrer a processos físicos ou presenciais, apresentar documentação em papel ou mesmo constituir representantes legais para cumprir exigências administrativas em outro país do Mercosul.
“Com a interoperabilidade das identidades digitais, esses trâmites passam a ser eletrônicos, confiáveis e praticamente instantâneos. A burocracia se reduz porque o governo receptor confia na autenticação feita pelo país de origem do cidadão, evitando duplicidade de procedimentos”, explicou.
A advogada especialista em direito administrativo e público, Deborah Toni, concorda e diz que esse movimento de integração é positivo, sobretudo por reduzir barreiras. “O que a gente percebe é que essa iniciativa tornaria ainda mais evidente a ausência de barreira física entre um país e outro na América Latina”, afirmou.
Já a especialista em direito internacional Fernanda Burle, sócia do MJ Alves Burle e Viana Advogados, apontou que os governos enfrentarão um desafio para implementar, na prática, esse sistema regional de cidadania digital. O Brasil, segundo ela, promoveu enormes avanços nessa área nos últimos anos, “mas ainda precisa aprimorar seus próprios sistemas digitais para promover o acesso e o letramento digital da população”.