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Marçal usa até helicóptero de sua empresa em agendas de campanha; prática pode ir parar na Justiça
Ex-coach tem usado aeronave registrada em nome de uma empresa de seu grupo, que também empresta profissional para gerenciamento de redes sociais; procurado semana passada e nesta terça, o pré-candidato não quis se manifestar
Por Bianca Gomes
(Foto: Reprodução Instagram @pablomarcal1)
Pablo Marçal, candidato do PRTB à Prefeitura de São Paulo, tem empregado sua estrutura empresarial na pré-campanha, numa prática que já incomoda adversários políticos e pode ser alvo de questionamentos na Justiça, segundo especialistas em direito eleitoral ouvidos pelo Estadão. Procurado no fim da semana passada e nesta terça-feira, o pré-candidato do PRTB não quis se manifestar.
O ex-coach tem usado um helicóptero registrado em nome de uma de suas empresas, a Marçal Participações LTDA, para comparecer a compromissos eleitorais pela cidade. Foi assim que ele chegou a uma agenda na Avenida Paulista no mês passado, onde discursou para apoiadores, gravou um podcast e concedeu entrevista à imprensa.
Na ocasião, Marçal também disparou ataques contra Guilherme Boulos, candidato do PSOL, oficializado em convenção no último sábado, 20, e apresentou algumas de suas propostas para a cidade. A chegada em um heliponto próximo ao cartão-postal paulistano foi compartilhada nas redes sociais do empresário.
As redes sociais de Pablo Marçal, onde ele anunciou sua pré-candidatura em 26 de maio e onde publica conteúdos de teor eleitoral, são gerenciadas por um profissional que, no LinkedIn, se apresenta como Chief Marketing Officer (CMO) do Grupo Marçal e gestor da Marçal Digital. Além disso, de acordo com informações na mesma rede social, uma funcionária de Marçal também tem atuado na comunicação da pré-campanha.
No ano passado, Marçal, que terá seu nome referendado pelo partido no próximo dia 3 de agosto, foi alvo de uma operação da Polícia Federal que apura crimes eleitorais de falsidade ideológica, apropriação indébita e lavagem de capitais na eleição de 2022.
Como mostrou o Estadão à época, a Polícia Federal suspeita que o político e seu sócio fizeram doações milionárias à campanha, sendo que “boa parte” dos valores foi remetida às próprias empresas que a dupla controlava. No último pleito, Marçal tentou disputar a presidência pelo PROS, mas o partido cancelou seu registro de candidatura para apoiar Lula (PT). Marçal, então, decidiu concorrer ao cargo de deputado federal, mas acabou tendo sua candidatura cassada pela Justiça.
“Em termos hipotéticos e em análise superficial, cabe ao candidato provar que não recebeu nem utilizou recursos de pessoas jurídicas, direta ou indiretamente. O uso de recursos vedados pode configurar um grave problema de abuso de poder econômico, já que doações de pessoas jurídicas são proibidas tanto durante a campanha quanto na pré-campanha”, afirma a advogada eleitoralista Clara Feitosa Petrola.
“Os gastos realizados em pré-campanha também são objeto de análise pela Justiça Eleitoral, e o uso de helicóptero em vários atos de pré-campanha e campanha pode ensejar, a qualquer tempo, representação com pedido de medida cautelar inibitória, visando resguardar o equilíbrio do pleito. Caso seja comprovada irregularidade com reconhecimento de abuso de poder econômico, pode resultar em cassação do registro, do diploma, ou do mandato, e gerar inelegibilidade”, explica ela.
Fernando Neisser, professor de direito eleitoral da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo, também afirma que é ilegal usar qualquer estrutura empresarial na pré-campanha, mesmo que a empresa esteja em nome do próprio pré-candidato. Dependendo do volume de recursos envolvidos, a prática pode configurar abuso de poder econômico. Segundo Neisser, para usar o avião de sua empresa de forma legal, Marçal precisa firmar um contrato entre a sua campanha e a empresa, pagando valor de mercado pela locação – o que Marçal não respondeu à reportagem se fez.
Neisser destaca outra prática que pode levar Marçal a enfrentar problemas na Justiça: o fato de o ex-coach ter prometido ganhos financeiros a apoiadores que compartilham seu conteúdo, numa estratégia para alavancar sua própria audiência.
“O fato de ele [Marçal] usar [na pré-campanha] perfis nas redes sociais que ele já utilizava comercialmente, por si só, não seria ilegal. O que pode ser ilegal e configurar abuso de poder econômico é se ficar demonstrado, por exemplo, que ele teria contratado pessoas para fazer cortes de vídeos dele e bombarem nas próprias redes sociais logo antes de se anunciar como pré-candidato. Essa é uma estratégia de amplificação de alcance que um pré-candidato ou candidato não pode usar, especialmente às vésperas de lançar sua pré-candidatura”, explica o especialista.
Segundo informações do portal DivulgaCand, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Pablo Marçal transferiu R$ 968,5 mil do próprio bolso para a sua campanha presidencial que não vingou, e outros R$ 288,7 mil para a campanha de deputado federal.
Em sabatina promovida pelo site Uol e o jornal Folha de S.Paulo, Marçal foi questionado sobre como vai tratar o dinheiro desta campanha e se irá contratar suas próprias empresas novamente. Ele respondeu que, na última eleição, ele, sua esposa e seu sócio doaram dinheiro para a campanha.
“Não tem um real de dinheiro público”, afirmou o ex-coach, que continuou: “Eu sou jurista, fiquei cinco anos na academia de direito, tenho um corpo jurídico muito bom. Nós avaliamos e falamos: vamos contratar um táxi aéreo para gastar R$ 20 mil, R$ 30 mil por hora? Não, vou usar a minha máquina, que eu gasto R$ 8 mil, R$ 12 mil por hora. E tudo está muito bem declarado”, declarou Marçal na ocasião, que ainda afirmou estar sendo vítima de perseguição.