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Justiça decide que plano de saúde empresarial vendido a uma família é “falso coletivo” e limita reajustes de valores
STJ mantém decisão do TJ-SP que obriga operadora de plano de saúde a devolver à família valores cobrados a mais após reajustes abusivos
Por Marcos Furtado — Rio de Janeiro
Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a decisão que enquadrou como abusivos os aumentos aplicados em um plano de saúde empresarial formado por apenas quatro pessoas da mesma família. Para a Justiça, o contrato, vendido como coletivo, funcionava na prática como um plano familiar. Dessa forma, deveria seguir os limites de reajuste definidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), atualmente de 6% ao ano.
A empresa familiar que contratou o plano havia acionado a Justiça para contestar os reajustes, alegando que os aumentos ultrapassavam os percentuais autorizados pela ANS para os planos individuais e familiares.
Por ter sido vendido como plano empresarial, a operadora aplicava no reajuste a lógica da sinistralidade, mecanismo que dá maior liberdade às empresas para rever preços em planos coletivos. Esse tipo de cálculo compara o valor pago em mensalidades com os custos dos procedimentos utilizados pelo grupo de beneficiários.
No entanto, em grupos muito pequenos, qualquer tratamento mais caro desequilibra a conta e pode justificar reajustes elevados. Foi o que ocorreu no caso levado à Justiça: por reunir apenas quatro pessoas de um mesmo núcleo familiar, o contrato não diluía riscos.
Renata Mangueira de Souza, sócia especialista em processo civil do Gasparini, Barbosa e Freire Advogados, afirma que esse tipo de situação tem se tornado mais comum porque muitas famílias são empurradas para planos empresariais por falta de alternativa:
— O problema é que as próprias operadoras ou seguradoras, em muitos casos, não aceitam mais contratar plano familiar, seja um pai de família com três filhos ou um casal.
Para a especialista, transformar famílias em “pessoas jurídicas” fragiliza ainda mais quem busca assistência médica.
— Isso gera um dano imenso para o consumidor, porque ele fica sujeito a reajustes abusivos, a uma menor proteção jurídica e a cancelamento abrupto. As regras de rescisão são diferentes para a pessoa jurídica e para a pessoa física — explica.
Tanto o juiz de primeira instância quanto o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) consideraram o contrato um “falso coletivo” e que o plano deveria seguir as regras dos contratos individuais e familiares. Na decisão, foi determinado que a operadora devolvesse, com correção monetária e juros, os valores pagos a mais pela família por causa dos aumentos abusivos.
A operadora recorreu ao STJ alegando que o contrato era formalmente coletivo. No entanto, o tribunal superior nem chegou a analisar o mérito. A Corte afirmou que já existem decisões consolidadas sobre casos semelhantes e que não cabe reexame de fatos em instância superior, motivo pelo qual manteve o entendimento do TJ-SP.
Dessa forma, permanece a conclusão de que não havia um grupo capaz de diluir risco — característica essencial dos planos coletivos — e que, portanto, os reajustes aplicados foram irregulares.
A decisão, no entanto, não estabelece um número limite de pessoas do mesmo grupo familiar para um plano empresarial ser considerado falso coletivo.





