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Gol se prepara para sair da Bolsa; o que o investidor deve fazer?
João José Oliveira
Do UOL, em São Paulo
Imagem: Divulgação
Ao anunciar que vai fazer uma reorganização societária, a Gol dá o primeiro passo para sair da Bolsa brasileira, reduzir custos e atrair novos sócios, passando a ser negociada apenas no exterior. O investidor que tem ações da companhia aérea poderá escolher entre continuar sócio, vender seus papéis para a própria Gol ou se desfazer deles na Bolsa antes de a reorganização ser concluída.
O que aconteceu
A Gol anunciou ontem um plano para fechar capital no Brasil. Se for aprovado em assembleia de acionistas convocada para 4 de novembro, a companhia deixará de ter suas ações listadas e negociadas na Bolsa B3.
Os investidores minoritários que quiserem continuar sócios da companhia devem esperar a aprovação do processo em assembleia, no dia 4 de novembro. Nesse caso, esses acionistas minoritários vão receber ações da Gol Linhas Aéreas S.A. (GLA), que vai absorver a Gol Linhas Aéreas Inteligentes.
Eles receberão, em troca das suas atuais ações, outras ações da GLA (Gol Linhas Aéreas), um tipo de empresa-mãe que vai incorporar a Gol atualmente listada na Bolsa e pode abrir capital no exterior no futuro. A relação de troca é de uma ação ordinária da GLA para cada ação ordinária da Gol atual e 35 ações ordinárias da GLA para cada ação preferencial da Gol atual.
“Na prática, ficar com ações fora da B3 significa abrir mão de liquidez e de transparência, já que a Gol Linhas Aéreas, controlada pela holding Abra, não terá as mesmas obrigações de divulgação de resultados e governança que uma companhia listada. Isso reduz consideravelmente a atratividade do papel, especialmente para o investidor pessoa física”.
Régis Chinchila, analista da Terra Investimentos
Se os investidores preferirem vender de volta as ações atuais para a própria Gol, devem se manifestar também após a assembleia de acionistas. Essa recompra por parte da Gol é chamada OPA (Oferta Pública de Aquisição). Nesse processo, a Gol vai fazer uma proposta para recomprar as ações preferenciais que os investidores têm na carteira.
O preço da recompra será definido por um avaliador contratado depois da aprovação do plano, mas o teto está sendo estimado em R$ 6,25 por papel preferencial. A empresa disse, na proposta de reorganização, que pretende gastar no máximo um total de R$ 47,25 milhões na OPA, e existem atualmente 7,5 bilhões de papeis preferenciais em circulação, agrupados em lotes de mil.
A expectativa pela OPA alimentou parte de um movimento de compra das ações da Gol, o que está fazendo o papel subir hoje. Perto do fechamento, às 16h55, a ação subia 2,56%, valendo R$ 5,21 na B3.
Outra opção é se desfazer da ação na Bolsa antes. O investidor que não quiser aguardar o desfecho desse processo de reorganização pode vender a ação que possui na B3 enquanto o capital da empresa não é fechado.
“A decisão de aeitar ou não a oferta de venda das ações dependerá do preço justo definido no laudo de avaliação da companhia”.
Bruna da Costa Gomes, advogada do Eichenberg, Lobato e Abreu Advogados
Perspectivas para a Gol e o setor aéreo da Bolsa
A Gol é vice-líder da aviação brasileira. Dona de 30,1% do transporte doméstico de passageiros no país em agosto, segundo a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), em termos de passageiros quilômetros transportados. A Gol transportou no segundo trimestre deste ano, último balanço divulgado da companhia, oito milhões de passageiros, 19% mais que um ano antes, elevou a receita líquida em 22,9%, para R$ 4,8 bilhões, melhorou a margem operacional (Ebitda) de 17,2% para 23,4%.
A empresa segue pressionada pelo alto endividamento. A dívida líquida de R$ 20,5 bilhões consumiu R$ 1,3 bilhão em despesas financeiras apenas nos três meses encerrados em 30 de junho.
O objetivo da reorganização da Gol é buscar sinergias e reduzir custos, disse a companhia. Com a extinção de duas empresas que serão incorporadas pela GLA e mais o encerramento da listagem das ações na Bolsa brasileira, a Gol vai reduzir diversos custos financeiros, de contabilidade a auditoria, além de outras despesas que uma companhia aberta tem para seguir as determinações da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) e da B3.
“Faz sentido para empresa reduzir custos na B3 e CVM. Isso pode gerar uma economia de uns R$ 2 milhões por ano. Pode parecer pouco, mas para uma empresa em reestruturação, qualquer valor faz diferença”.
Hugo Queiroz, sócio-gestor da L4 Capital
A negociação da ação da Gol na Bolsa brasileira vem caindo. Desde janeiro de 2024, quando recorreu ao processo nos Estados Unidos equivalente à recuperação judicial no Brasil, o chamado Chapter 11, a Gol precisou receber aportes de capital dos principais sócios. Em maio deste ano, foram R$ 12 bilhões de sócios e capitalização de créditos de credores. Após a operação, a Gol Investment Brasil passou a deter cerca de 99,97% das ações ordinárias e 99,22% das ações preferenciais, deixando apenas 0,78% de free float, bem abaixo do mínimo exigido pela B3, de 15%.
“A ação da Gol já tinha pouca liquidez, nem participava mais dos índices, então o custo de manter a empresa listada aqui não se justifica mais”.
Fernando Siqueira, chefe de pesquisa da consultoria de investimentos Eleven
O passo seguinte é atrair capital e negociar ações no exterior. Desde 2022, quando a Gol entrou num acordo com a Avianca da Colômbia para criar a Abra, a companhia já sinalizava a intenção de consolidar as operações em um grupo internacional, com atuação em vários países e reduzir a dependência do mercado doméstico brasileiro. A reorganização societária proposta agora reforça essa estratégia, segundo especialistas.
“Ao se juntar a outras operações do setor de aviação através da holding Abra, a Gol passa a fazer parte de um grupo maior, o que não só simplifica a governança, mas também fortalece a sua posição para negociar e competir em uma escala global”.
Bruna da Costa Gomes, advogada do Eichenberg, Lobato e Abreu Advogados
Outra opção para seguir investindo na aviação nacional é a Azul Linhas Aéreas, terceira maior transportadora do país, com 28,4% do mercado. Mas a empresa também enfrenta os mesmos desafios, dizem analistas de mercado. Eles citam a carga tributária alta na querosene, custos operacionais e financeiros elevados e voláteis por causa das oscilações do dólar e do petróleo, além de uma receita que depende do ritmo da economia e do crédito.
A Embraer também pode atrair investidores. A empresa aeroespacial brasileira é outra empresa que pode receber parte do fluxo de recursos dos investidores que saírem de Gol e decidirem seguir no setor aéreo. A atividade da fabricante opera com margens operacionais maiores que as das transportadoras.
“Quem quiser manter uma fatia do aéreo pode olhar Azul e, de forma indireta, Embraer no Brasil, além de companhias e ETFs lá fora via conta internacional ou BDRs”.
Jonathan Mazon, sócio do Ayres Westin Advogados