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Apagão da Enel vira arena de pugilato político
Carla Jimenez
(Foto: Agência Brasil)
O novo apagão da Enel, em pleno segundo turno, está pautando as campanhas de Guilherme Boulos (PSOL) e do prefeito Ricardo Nunes (MDB) e entrou de cara no debate realizado na última segunda, na TV Bandeirantes. Boulos jogou para Nunes a conta da falta de podas de milhares de árvores que atrasa a retomada da energia até hoje, cinco dias após as chuvas que geraram o estrago. Nunes devolveu, culpando a Enel e o governo federal.
O prefeito colou no governador do Estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos), nesta reta final da campanha, para se proteger das investidas de Boulos e de se ver associado ao apagão da Enel. A estratégia tem se mostrado um jogo de empurra cômodo, em que todos têm um pouco de razão, e ninguém se compromete com os prejuízos físicos, financeiros e emocionais que milhões de paulistanos tiveram desde a última sexta-feira. Vacinas vencidas, alimentos estragados, eletrodomésticos queimados.
Nunes e Tarcísio elevaram o tom se colocando no papel de clientes indignados da Enel. “A empresa já se mostrou incapaz de prestar serviço no estado de São Paulo”, disse o governador durante reunião com os 17 prefeitos da região metropolitana de São Paulo, que decidiram enviar uma carta ao TCU (Tribunal de Contas da União) para pedir intervenção na Enel.
O prefeito foi além. Confiante no papel de gestor da cidade que é a principal cliente da empresa, Nunes entrou no jogo de levantar a voz. Após ser criticado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que reclamou do prefeito por ele ter dito que a empresa iria renovar a concessão com apoio do governo federal, mesmo diante de tantos problemas causados à cidade, o emedebista retrucou dizendo que Silveira não faz nada — e usou o termo “vagabundo” para se referir a ele, ainda que indiretamente. De fato, Silveira mencionou o tema em evento na Itália, como contou a colunista Raquel Landim. Silveira, no entanto, disse que Nunes havia feito “fake news” a respeito.
Segundo Silveira, o prefeito de São Paulo fez “politicagem de baixo calão” pelas redes sociais. “Foi uma fake news oficial do prefeito da maior metrópole do Brasil. E com tristeza, porque o recebi no meu gabinete, a pedido da bancada do MDB, com o maior respeito”, lamentou, citando publicações feitas no domingo (13) por Nunes.
“Nós não temos o que fazer, e esses vagabundos lá não estão fazendo nada, e nós estamos aqui sofrendo. Sofrendo. Os vagabundos não estão fazendo nada. Tanto a empresa, como o ministério”, disse o prefeito, escalando a narrativa sobre a crise. “O ministério, esse ministro não faz nada”, completou.
Muito palanque político, pouca solução. Um jogo perigoso com enormes chances de se voltar como bumerangue para quem hoje se beneficia da crise.
Nunes, se reeleito, não terá como fugir das críticas sobre o que não está sendo feito em relação às árvores. Após dois apagões graves, a população já começou a ligar os pontos sobre a responsabilidade de quem é quem. Tarcísio, por outro lado, como padrinho político de Nunes e entusiasta defensor do processo de privatização, não vai poder fugir da “paternidade” de outra empresa de serviço essencial delegada ao setor privado, que é a Sabesp.
A nova acionista da empresa, a Equatorial, só tem dois anos de experiência na área de saneamento básico. Se ninguém assume seu papel de conivência no caso da Enel, que assumiu a dianteira da distribuição em 2018, no caso da Sabesp, o governador não terá como fugir.
“O episódio tem servido de palanque político, com prejuízo à população”, diz Joaquim Augusto Melo de Queiroz, sócio da área de Energia do Giamundo Neto Advogados. “Eventos climáticos extremos já não são uma novidade. O que se verifica é a falha na adoção de medidas preventivas que poderiam mitigar o impacto para a população, permitindo a retomada dos serviços de distribuição de energia de forma mais célere”, completa.
Nesta quarta, o prefeito anunciou um comitê de crise diante da previsão de que chuvas intensas devem cair na capital paulista outra vez nesta sexta (18). À frente nas pesquisas, Nunes torce pela reação da Enel… e deve estar rezando para São Pedro não castigar tanto a cidade.
https://noticias.uol.com.br/newsletters/radar-das-eleicoes/o-bode-na-sala-da-enel-vai-ficar.htm