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Análise: Produtor rural na reforma tributária: menos tributo, mais competitividade
Falta pouco para a reforma tributária entrar em fase de testes. Por ser uma novidade, muitos preferem defender o caos – até porque é mais fácil fazer oposição do que cooperar para a adaptação ao novo sistema. No recorte do produtor rural, setor que sustenta grande parte da economia brasileira, percebe-se que as críticas mais recorrentes carecem de análise aprofundada dos avanços obtidos.
Esses avanços não se limitam à comparação com as versões iniciais das propostas (PEC e PLPs) discutidas no Congresso e aprimoradas pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), mas também em relação ao sistema tributário atual.
Hoje, o produtor rural paga tributos embutidos no preço dos insumos. O mesmo ocorre com o adquirente da produção. Dois exemplos ilustram bem esse cenário:
1. ICMS sobre insumos – A revogação da Cláusula Quinta do Convênio 26/2021 obrigou a indústria a estornar créditos de ICMS, transformando o imposto em custo incorporado ao preço.
2. PIS/Cofins e crédito presumido – Apesar das regras da Lei 10.925/2004, litígios sobre classificações fiscais e limitações do crédito presumido reduzem a efetividade da não cumulatividade.
Além disso, há acúmulo de créditos de ICMS, PIS e Cofins que não podem ser plenamente aproveitados. No fim, tanto o produtor quanto o consumidor arcam com essa “tributação fantasma”, que inclusive compromete a desoneração das exportações.
Com a reforma, PIS/Cofins, IPI, ICMS e ISS darão lugar ao IBS (estados, DF e municípios), à CBS (federal) e ao Imposto Seletivo (federal). Para o agro, o ponto central está no IBS e na CBS, já que a Constituição impede a incidência do Seletivo sobre insumos e produtos agropecuários – uma conquista relevante.
Os dois novos tributos funcionam no modelo de valor agregado, com direito amplo a créditos. Além disso, o produtor rural que fatura até R$ 3,6 milhões por ano será considerado não contribuinte, haverá redução de 60% nas alíquotas para insumos e produtos do setor, e será possível suspender a tributação de vendas destinadas à industrialização e exportação.
Outro avanço está no diferimento da tributação dos insumos agropecuários (art. 138 da LC 214/2025). Isso significa que o produtor não pagará o tributo na compra: o imposto só será recolhido na venda da produção, pelo adquirente. A medida reduz o custo imediato e a necessidade de fluxo de caixa.
Tomando como base a CNA, é possível medir o impacto:
- Soja e milho em Rio Verde (GO): insumos representam 61% do custo – todos beneficiados pelo diferimento.
- Milho em Guarapuava (PR): 60%.
- Pecuária de corte: entre 46% e 79%, dependendo da etapa produtiva.
- Pecuária de leite: 75%.
Em resumo, o novo modelo elimina a tributação oculta dos insumos, efetiva a não cumulatividade e cria mecanismos mais claros de devolução de créditos. É uma mudança estrutural que reduz custos, aumenta a competitividade e traz mais transparência à formação de preços.
Isso não significa, porém, que o debate esteja encerrado. Uma evolução possível seria estender o diferimento também à venda da produção, o que reforçaria ainda mais a lógica de simplificação e alívio no fluxo de caixa.
De todo modo, é inegável que o produtor rural está entre os grandes beneficiados da reforma. O desafio agora é a preparação para o novo ambiente: informação e planejamento tributário serão instrumentos decisivos para aproveitar ao máximo os ganhos dessa transição.
Por Eduardo Lourenço, sócio do Maneira Advogados; doutor e mestre em Direito Constitucional; LLM em Direito Tributário