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Advogados pedem acesso às provas e discutem delação

4 de setembro, 2025

Advogados pedem acesso às provas e discutem delação

Segundo especialistas em direito, advogados dos réus apontaram fragilidades da ação penal, mas têm margem estreita de atuação no STF

Por Joelmir Tavares — De São Paulo

04/09/2025 05h01 Atualizado agora

As defesas do ex-presidente Jair Bolsonaro e de seus aliados usaram o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar afastar os réus das acusações por tentativa de golpe e reforçar o que veem como fragilidades da ação penal, mas têm margem estreita de atuação para tentar evitar as condenações, na avaliação de especialistas em direito consultados pelo Valor.

A sessão de quarta-feira (3), que contou com a sustentação oral dos advogados de Bolsonaro, foi marcada por um esforço para negar qualquer elo entre ele e os crimes, mas também pela tentativa das defesas dos demais réus de se descolar de ações imputadas ao ex-presidente na chamada trama golpista. Na esfera processual, foram destacadas questões como acesso restrito ao universo de provas e cerceamento do direito de defesa.

“As defesas apresentadas se concentraram, naturalmente, em tentar desconstruir a narrativa da acusação, destacando o que entendem como ausência ou insuficiência de provas diretas contra os acusados”, diz Rogério Taffarello, sócio especialista em direito penal do escritório Mattos Filho e professor da FGV-SP.

Segundo Taffarello, um ponto que merece atenção é a “crítica à falta de paridade de armas, com alegações de prejuízo à ampla defesa devido ao acesso limitado que afirmam ter tido a elementos de prova utilizados pela acusação”. Ele avalia, no entanto, que a queixa tem chances remotas de produzir alguma mudança concreta no julgamento. “Dependerá do  que o tribunal entender como dificuldade relevante, [algo] que teria efetivamente, ou não, dificultado o exercício do direito de defesa.”

Beatriz Alaia Colin, especialista em direito criminal do Wilton Gomes Advogados, diz que as garantias aos advogados são essenciais e que é preciso observar, por exemplo, o tempo hábil para a análise de provas. “Mas o fato é que, em se tratando de um processo iniciado no STF, as defesas não vão ter uma ampla gama de recursos para se contrapor a quaisquer medidas”, afirma. Segundo Colin, a argumentação é útil para as defesas prepararem terreno para futuras mudanças de composição do STF. Com renovação no quadro de ministros, pode-se abrir margem para uma eventual reavaliação do caso.

Para que uma defesa seja efetiva, é “indispensável” que os denunciados possam conhecer todo material que embasa a acusação e tudo o que levou o Ministério Público a pedir a condenação, reforça o criminalista Daniel Zaclis. “Na prática, no entanto, é pouco provável que esse argumento seja considerado pelo STF”, afirma o mestre em direito processual penal pela USP.

“As defesas não vão ter uma ampla gama de recursos para se contrapor”

Beatriz Alaia Colin

Os três profissionais ouvidos consideram que os advogados dos réus defenderam, prioritariamente, a absolvição deles, sem um foco em atenuar as punições, neste momento.

Segundo Taffarello, um tema que está “no horizonte” do julgamento é o debate a respeito da sobreposição de penas dos crimes de tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Na visão dele, o primeiro tipo penal deveria absorver o segundo, “fazendo com que só as penas do primeiro sejam aplicáveis”.

Os questionamentos das defesas sobre a validade do acordo de colaboração premiada firmado pelo tenente-coronel Mauro Cid também devem render novas discussões. Colin frisa, contudo, que o STF tem sinalizado que a delação é válida. “Entendo que há alguns pontos contraditórios, mas não tão relevantes para a narrativa a ponto de ensejarem a rescisão do acordo”, afirma. Ela completa que o procurador-geral da República, Paulo Gonet, enfatizou haver “outras provas além da palavra do delator para subsidiar a condenação”.

Segundo Taffarello, o STF pode avaliar “se houve intenção deliberada em omissões ou confusões eventualmente feitas”, respeitando o direito de defesa e de autodefesa do colaborador. “Cabe ao tribunal analisar a credibilidade, uma a uma, das declarações do colaborador à luz dos demais elementos de prova dos autos, lembrando que, de qualquer modo, a lei somente autoriza a condenação se houver provas suficientes e independentes das declarações do colaborador.”

Zaclis concorda que a discussão deve ser feita com cautela. “Quando se verifica que um indivíduo delator falta com a verdade em alguns pontos de sua versão, não se pode simplesmente ‘picotar’ aquilo que interessa para uma parte ou outra. O próprio Ministério Público reconheceu que o delator trouxe dados verdadeiros, porém incompletos. Isso, naturalmente, afeta a credibilidade da colaboração.”

https://valor.globo.com/politica/noticia/2025/09/04/advogados-pedem-acesso-as-provas-e-discutem-delacao.ghtml

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