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Advogados divergem sobre decisão de Moraes que mantém Bolsonaro preso
Ana Paula Bimbati e Saulo Pereira Guimarães
Do UOL, em São Paulo
Imagem: Gustavo Moreno/STF
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes negou o pedido da defesa de Jair Bolsonaro (PL) para revogar a prisão domiciliar do ex-presidente. Advogados e juristas consultados pelo UOL divergiram sobre a legalidade da decisão.
O que aconteceu
Como Bolsonaro responde por diferentes processos no STF, o entendimento não é um consenso. Especialistas indicam que Moraes pode manter a prisão domiciliar já que apresentou argumentos pela manutenção das medidas cautelares. Quem diverge aponta que, com a ausência do ex-presidente na denúncia apresentada pela PGR (Procuradoria-Geral da República), manter a domiciliar é seguir uma decisão “inviável e arbitrária”.
A defesa se apoiou na ausência de Bolsonaro em denúncia de obstrução à Justiça. A PGR denunciou em setembro o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o empresário Paulo Figueiredo por tentativa de interferência no julgamento da trama golpista. Os advogados do ex-presidente apontam que as medidas cautelares foram determinadas nesta ação e, com Bolsonaro fora, não há motivos para a manutenção.
Medidas cautelares valem para todos os processos contra Bolsonaro, diz advogado. Segundo Thiago Bottino, professor da FGV Direito Rio, a decisão de Moraes é legal, já que o ex-presidente descumpriu as medidas também no processo da ação penal.
Para Pedro Bueno de Andrade, a PGR deveria pedir a decretação de medidas na ação penal da tentativa de golpe. “E não no inquérito em que o ex-presidente não foi sequer denunciado”, aponta o criminalista. Segundo ele, no momento em que Bolsonaro não é denunciado, pode-se concluir que há “ausência de indícios de autoria em relação a ele”.
“A pena que o ex-presidente poderá ter que cumprir se a condenação for mantida após o julgamento dos recursos das defesas diz respeito somente aos crimes de tentativa de golpe de estado pelos quais Bolsonaro foi processado. Assim, a manutenção de uma prisão domiciliar decretada em outro inquérito independente é inviável e arbitrária”.
Pedro Bueno de Andrade, advogado criminalista
“É como se fosse uma ‘nova’ prisão cautelar”, defende Helena Lobo da Costa. Para a professora de direito penal da USP, os requisitos para manutenção da prisão “estão presentes” e é “relativamente comum” um réu ter prisões decretadas em mais de um processo em paralelo.
Decisões como a de Moraes são comuns em casos de réus com “histórico de condutas delituosas”, diz advogada. Criminalista do escritório Wilton Gomes Advogados, Amanda Santos afirma que o risco concreto de fuga, ameaça à ordem pública e descumprimento de medidas cautelares, citados por Moraes na decisão, são motivos que costumam embasar decisões desse tipo.
Manutenção da prisão está embasada no “risco de fuga” de Bolsonaro após condenação por tentativa de golpe, explica Ana Krasovic. Sócia do escritório João Victor Abreu Advogados Associados e especialista em Direito Penal e Processual Penal, a criminalista afirma que esse risco “pode ser utilizado como fundamento” para manter a prisão, no entendimento dela.
Abatimento do tempo de prisão preventiva no cumprimento da pena também não é consenso. Andrade e Bottino entendem que o tempo em que Bolsonaro está em prisão domiciliar poderá ser abatido de sua pena por tentativa de golpe, caso ela se confirme. Já Amanda e a criminalista Ana Krasovic acreditam que o abatimento só poderá ocorrer na ação de obstrução à Justiça, caso o ex-presidente seja condenado.
A prisão domiciliar ocorreu em agosto após Bolsonaro não seguir medidas cautelares estabelecidas em julho. Inicialmente, Moraes determinou a proibição de acessar as redes sociais e o uso de tornozeleira eletrônica. Depois, após ações do ex-presidente, o ministro do STF determinou a prisão domiciliar. No dia anterior, diferentes capitais receberam manifestações bolsonaristas e o ex-presidente chegou a participar de uma delas por videochamada. Fotos usando tornozeleira eletrônica também foram publicadas.
Ontem, ao manter a prisão, o ministro citou “garantia da ordem legal”. Moraes seguiu o entendimento da PGR que afirma que manter as medidas cautelares “são imprescindíveis para evitar a fuga” de Bolsonaro. A Procuradoria-Geral disse que a manutenção assegura também “a execução da pena recentemente imposta ao réu pela Primeira Turma” por tentativa de golpe.
O que dizem Moraes e a PGR
“Ausente qualquer elemento novo capaz de infirmar a validade ou a necessidade das cautelares, não há razão jurídica para a sua revogação ou modificação. Ao revés, as medidas preservam a integridade da jurisdição penal da Suprema Corte e garantem a efetividade da aplicação da lei penal”.
Procuradoria-Geral da República
“A manutenção da prisão domiciliar e das medidas cautelares impostas ao réu são necessárias e adequadas para cessar o acentuado periculum libertatis, demonstrando não só pela condenação do réu na AP 2668, mas também pelos reiterados descumprimentos das medidas cautelares”.
Alexandre de Moraes, ministro do STF