carregando...

PORTFÓLIO

Três perguntas: os fundos de pensão estão blindados contra corrupção?

8 de setembro, 2022

FONTE: MONITOR MERCANTIL

Por Jorge Priori

8 De Setembro De 2022

Conversamos com Bernardo Viana, sócio do escritório Almeida Advogados, sobre se os fundos de pensão das estatais estão blindados contra a corrupção.

Os fundos de pensão das estatais estão blindados contra a corrupção?

Em primeiro lugar, não, já que é impossível existir uma blindagem de 100%. Sem querer ser exageradamente técnico, eu posso ter a melhor legislação, a melhor regulação, o melhor programa no papel, as melhores instâncias, a melhor governança, as melhores políticas internas de auditoria, investigação, treinamento e comunicação, mas se isso não for bem feito, é impossível você ter 100% de certeza. Ainda que você faça tudo que está planejado, você tem a possibilidade de ter um empregado tomando uma medida que não seja correta.

Como nós estamos falando de fundos de pensão das estatais, estamos falando de estruturas que são muito travadas por regulação e pela existência de auditorias do TCU, dos patrocinadores e dos próprios fundos. A meu ver, os problemas que ocorreram num passado recente foram muito mais uma falha de quem estava nas cadeiras e dos órgãos competentes em prevenir e fiscalizar em real time, em vez de se deixar tomar prejuízos por anos, do que a existência dos fundos de pensão em si.

Por mais que os fundos de pensão não estejam blindados, em tese, eles estão em melhores condições do que há 7, 8 anos atrás. Em tese, há um risco menor do que aconteceu se repetir, mas não só pelos motivos de melhoria de governança, mas porque eles estão totalmente deficitários. Há muito dinheiro, mas não é como era antes.

Ainda que se pense para o futuro, ainda não se resolveu o passado. Por exemplo, o Postalis está com um rombo de R$ 12 bilhões, sendo que apenas a metade está equacionada, ou seja, contabilmente provisionada com base nas contribuições adicionais que os carteiros estão fazendo.

Mesmo assim, os fundos estão mais bem preparados. A própria existência do problema anterior facilita que haja visibilidade com relação ao problema presente e futuro, mas ainda é totalmente possível que se descubra alguma coisa. Um detalhe interessante é que o grande gatilho dos problemas do passado foram os déficits. Se isso não tivesse acontecido da forma como foi, talvez os problemas nunca tivessem sido descobertos.

A Lei 13.303, de 30 de junho de 2016, também conhecida como Lei das Estatais, protegeu as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as subsidiárias. Os fundos de pensão das estatais tiveram uma legislação específica nesse sentido, ou, pelo menos, estão protegidos pela Lei das Estatais?

Essa é uma boa pergunta. A Lei das Estatais se aplica a todas as estatais. Ela não se aplica diretamente aos fundos de pensão, mas sim indiretamente, já que ela se aplica aos seus patrocinadores como Correios, Petrobras, Caixa e Banco do Brasil.

É impossível ter compliance, combate à corrupção ou tentativas de proteção sem que haja governança. A Lei das Estatais atacou muito esse ponto, colocando muitas restrições obrigatórias para as estatais. Isso já ajuda bastante.

Agora, isso vai ser aplicado? Está sendo fiscalizado corretamente? Todas as estatais estão seguindo em todos os aspectos? O problema é muito mais de execução do que de forma.

Apesar de nós termos complexo de vira-lata na hora de avaliarmos os nossos órgãos, eles têm muita capacidade técnica. Minha experiência com a CGU em acordos de leniência e programas de compliance é excelente. Seu corpo técnico é muito bom. Só que órgãos como TCU, Coaf, Polícia Federal e CGU precisam de mais recursos. Ainda que tenham um corpo técnico muito bom, eles não dão conta, já que é muita coisa para analisar e auditar.

Se não me engano, os danos causados ao Postalis vão de 2010 a 2019. Estamos em 2022, mas ainda muito longe de termos qualquer reparação. O problema não é falha técnica ou a inexistência de uma legislação que permita uma auditoria ou uma supervisão. O problema é a execução, e dentro dela, a alocação de recursos.

O Postalis é o exemplo mais grosseiro do que aconteceu com os fundos de pensão das estatais. Na sua opinião, se tirou alguma lição desse exemplo? Alguma coisa foi aprendida?

Sim, mas poderia ter se aprendido muito mais se as reparações já tivessem sido impostas. Nós temos um problema quando se passa tanto tempo sem que haja condenação firme em relação a todos os responsáveis, especialmente em se reparar os danos causados a milhares de famílias de carteiros. Com isso, nós temos uma sensação de impunidade. Para quem mais possa ter o interesse de cometer o ilícito, essa sinalização é muito ruim.

Com certeza se aprendeu, já que hoje se tem visibilidade sobre as coisas grosseiras que aconteceram não só com o Postalis, mas também com outros fundos. Só que isso foi suficiente? Nós não poderíamos ter feito muito mais com as informações que foram descobertas?

No Postalis estavam vários incentivos no sentido de haver muita gente interessada em cometer ilícitos, além da falta de fiscalização e o clima de impunidade que existia na época. Nós estamos falando do período pré Lava Jato, pré Lei Anticorrupção, pré Lei das Estatais e pré impeachment da Dilma. Enfim, era um outro tom, um outro ambiente de se fazer negócios.

https://monitormercantil.com.br/tres-perguntas-os-fundos-de-pensao-estao-blindados-contra-corrupcao/

Compartilhe