carregando...

PORTFÓLIO

Reciclagem: o Convênio nº 61/2024 e a Reforma Tributária

18 de junho, 2024

Por Claudia Abrosio e Rafael Pescuma Rodrigues da Silva, respectivamente sócia e estagiário do Ayres Ribeiro Advogados

O meio ambiente ecologicamente equilibrado é, de forma indiscutível, um direito de todos e uma garantia fundamental. A prática da sua preservação, mesmo sendo ainda pouco explorada por políticas públicas no Brasil, está se tornando mais presente nos recentes avanços da Reforma Tributária.

É nesse contexto que a “tributação ambiental” busca desempenhar, pela implementação de políticas fiscais ambientais, estímulos e desestímulos no comportamento dos contribuintes, sendo esse um importante passo.

Entre outras frentes, a reciclagem desempenha um papel vital na promoção de um futuro sustentável. Dar uma nova função aos resíduos sólidos, além de contribuir para a manutenção da biodiversidade e a mitigação das mudanças climáticas, ajuda a promover o consumo consciente e a responsabilidade ambiental.

Em 20/05/24, o Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), como um incentivo à prática da reciclagem, publicou o Convênio nº 61, autorizando os estados do Acre, Amapá, Bahia, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Piauí, Rio de Janeiro, Rondônia, Sergipe e São Paulo a concederem isenção de ICMS para cooperativas e associações de catadores que realizem operações internas com sucata, apara, resíduo ou fragmento de produtos, até 30/04/26.

O referido Convênio define como sucata, apara, resíduo ou fragmento, a mercadoria que não mais atender à finalidade para a qual foi produzida e que seja destinada à utilização como matéria-prima ou material secundário, em estabelecimento industrial.

Na sequência, o Ato Declaratório nº 16, publicado em 21/05/24, ratificou diversos Convênios ICMS, dentre eles o Convênio ICMS 61/2024.

Nessa narrativa, recentemente, o governo do estado de Minas Gerais anunciou, mediante implementação de um regime especial aprovado pela Comissão de Política Tributária da Secretaria de Estado de Fazenda, uma potencialização ao benefício às indústrias que realizam compra e venda de sucatas, resíduos e aparas destinados à reciclagem.

Com o objetivo de incentivar as indústrias locais e fomentar o setor da reciclagem dento do estado, foi estabelecida carga tributária de 3% do ICMS para aquelas que promovem a transformação da reciclagem em território mineiro e, além disso, a desoneração do imposto sobre as operações internas realizadas com resíduos para a indústria que os transformará.

De acordo com dados da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, somente em 2023 deixaram de ser direcionados para os lixões mineiros 25 mil toneladas de papel/papelão; 9,9 mil toneladas de plástico; 9 mil toneladas de vidro e 3 mil toneladas de metal.

Em vista disso, o estado de MG acrescentou a instituição desses benefícios, de modo a propiciar que toda a cadeia da reciclagem, ou grande parte, concentre-se no território mineiro, desde a coleta até a transformação da sucata, gerando maior valor agregado aos produtos.

Pois bem. Podemos identificar que o Brasil está caminhando para acompanhar a crescente tendência global de adotar políticas tributárias no intuito de incentivar a preservação e conservação ambiental. Atualmente, esse compromisso ganha ainda mais força com o rumo que está sendo tomado pela Reforma Tributária.

Tanto é assim que, com fundamento na EC nº 132/2023, no seu artigo 9°, § 6°, inciso II, e na recente regulamentação proposta no PLP n° 68/2024, a Reforma Tributária apresenta um regime diferenciado para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) em relação aos resíduos sólidos adquiridos de catadores ou cooperativa de catadores para que lhes seja dada uma destinação final ambientalmente adequada.

Segundo o regime diferenciado, o contribuinte que adquirir resíduos sólidos nessas condições poderá se apropriar de créditos presumidos do IBS e da CBS. Em outras palavras, será concedido crédito para aqueles que adquirirem resíduos sólidos destinados à reutilização, reciclagem, compostagem ou recuperação, apesar das dificuldades inerentes ao setor, em linha com o que estabelece a Política Nacional de Resíduos Sólidos, instituída pela Lei nº 12.305/2010.

Na prática, o crédito presumido, que foi definido em 20%, representa uma expressiva redução ao valor tributado. Tendo em vista a alíquota estimada do IBS e da CBS de 26,5%, a carga tributária seria reduzida a 6,5%, havendo uma redução de, aproximadamente, três quartos, quando comparado com a operação sem o benefício.

Apesar disso, não serão concedidos os créditos às aquisições de resíduos que demonstrem algum tipo de perigo ou toxicidade, desestimulando a exposição dos coletores a alguma condição de risco, como, por exemplo: agrotóxicos, aos seus resíduos e embalagens; óleos lubrificantes, aos seus resíduos e embalagens; lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; entre outros produtos.

Em suma, a concessão de benefícios de ICMS e de crédito presumido sob regime diferenciado do IBS e da CBS aos adquirentes e catadores de materiais destinados à reciclagem, além de fazer frente à indústria extrativista, incentiva o crescimento do setor de reciclagem, mostrando possibilidades além da extração direta de recursos naturais.

As iniciativas vigentes, em conjunto com o regime diferenciado previsto na Reforma Tributária, representam propostas que buscam adequar o sistema tributário aos desafios e à preocupação com um futuro sustentável, participando, assim, da materialização de um caminho fundado em uma nova perspectiva sobre políticas públicas tributárias ambientais.

Durante o período de transição da Reforma Tributária, até que seja implementado de forma completa o novo regime no final de 2032, está aberta a possibilidade de serem apresentados novos benefícios e iniciativas sobre o tema em questão, tamanha a sua importância no cenário global que, com o passar dos anos, tende apenas a aumentar.

Claudia Abrosio, sócia do escritório Ayres Ribeiro Advogados, mestre em direito constitucional e processual tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Rafael Pescuma Rodrigues da Silva, estagiário tributarista no escritório Ayres Ribeiro e graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

https://analise.com/opiniao/reciclagem-o-convenio-n-612024-e-a-reforma-tributaria

Compartilhe