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Considerações sobre a decisão do STF acerca da Lei de Improbidade Administrativa
FONTE: ESTADÃO
Considerações sobre a decisão do STF acerca da Lei de Improbidade Administrativa
Marcela Caldas dos Reis*
19 de agosto de 2022
Na última quinta-feira (18/8), o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do Recurso Extraordinário nº 843.989, sendo fixada a tão aguardada tese de Repercussão Geral sobre o Tema 1199.
Em síntese, entendeu a Corte Suprema que para a propositura e condenação em ato de improbidade administrativa, em qualquer de suas modalidades, deverá estar presente o elemento subjetivo dolo.
No entanto, condenações já transitadas em julgado, proferidas com base em condutas culposas, isto é, cometidas por imprudência, negligência ou imperícia, não poderão ser rescindidas. Em suma, não será cabível o ajuizamento de ação rescisória com fundamento na nova lei (Lei 14.230/21), pois tais ações já foram atingidas pelo manto da coisa julgada.
No entanto, a nova lei retroagirá para atingir condutas culposas praticadas na vigência do texto anterior, desde que os processos estejam ainda em curso. Nesse cenário, a ação deverá ser extinta em razão da novatio legis in mellius.
Quanto à prescrição, fixou-se a tese da irretroatividade da nova lei, ou seja, os novos marcos temporais de prescrição valerão apenas a partir da publicação da nova lei.
Isso significa que os novos prazos prescricionais, leia-se: prescrição geral – prazo de oito anos para propositura da ação contados da data do fato -, ou prescrição intercorrente, só valerão a partir de 25 de outubro de 2021, data da publicação da Lei nº 14.230/2021.
Nesse sentido, imprescindível salientar que se a decisão da Corte Suprema tivesse sido pela retroatividade do novo regime prescricional, inúmeras ações seriam imediatamente extintas, beneficiando diversos agentes políticos, especialmente em razão do instituto da prescrição intercorrente, que inseriu a necessidade de observância do prazo máximo de quatro anos entre a propositura da ação e a publicação da sentença condenatória, por exemplo. E, como sabemos, a maioria das ações de improbidade arrastam-se ao longo dos anos, muitas vezes demorando cerca de quatro anos apenas para encerrar o ciclo citatório.
Não se pretende aqui tecer análise crítica sobre o julgamento proferido, que a nosso ver, deveria ter caminhado em linha oposta, ou seja, na linha justamente da opinião manifestada por alguns ministros, cujo entendimento, infelizmente, foi minoritário.
Isto porque, o Direito Administrativo Sancionador está inserido dentro do conceito do Direito Punitivo como um todo, e, portanto, assim como no âmbito penal, as normas mais benéficas previstas na nova Lei de Improbidade – tanto de ordem material quanto processual – deveriam retroagir, para atingir situações pretéritas.
Inobstante e, com todo o respeito à decisão proferida, inegável que a pretensão de muitos políticos de serem beneficiados e poderem, por exemplo, disputar o pleito eleitoral deste ano, foi tolhida pelo julgamento concluído na última quinta-feira, vez que aplicar-se-á o texto da lei anterior para as situações praticadas antes da vigência da nova lei, tanto no que diz respeito ao regime prescricional, quanto para condenações já passadas em julgado, ainda que fundamentadas em conduta culposa.
*Marcela Caldas dos Reis, advogada do escritório Vilela, Miranda e Aguiar Fernandes Advogados, pós-graduada em Direito Processual Civil pela PUC/SP e Professora Colaboradora de questões de concurso público nas áreas do Direito Administrativo e Constitucional.