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Tributação de dividendos é boa para quem?
Por Mauricio Braga Chapinoti
Há tempos, o Brasil flerta com a possibilidade de voltar a tributar dividendos com o argumento de que tal tributação impactaria a camada mais rica da sociedade, em benefício da camada mais baixa. Com exceção do ambiente acadêmico e especialistas em tributação da renda, pouco se discute sobre a efetividade dessa ideia e o impacto que isso causa no ambiente econômico brasileiro.
O governo federal anunciou um pacote que traz a ideia que vem sendo requentada desde 1997, quando teve início a isenção de Imposto de Renda sobre os dividendos. Em suma, a proposta da vez cria uma retenção de 10% sobre os dividendos distribuídos para quem recebe acima de R$ 50 mil/mês e estrangeiros.
Caminhamos a passos largos para um cenário tributário e fiscal perturbador, com todos os problemas apontados acima e uma carga tributária próxima de 40% (ou seja, 2/5 do PIB)
Em troca da isenção para quem recebe até R$ 5 mil/mês e isenção parcial para quem recebe até R$ 7 mil/mês, os que recebem acima disso terão que arcar com a diferença através da “tributação mínima da renda”. É óbvio que a desoneração da camada mais pobre da população é necessária e a percepção é que essa faixa de isenção deveria ser mais alta. Contudo, no contexto atual de descontrole fiscal, não há espaço no orçamento para isso, sem que haja uma contrapartida razoável para cobrir tal desoneração.
Entretanto, a efetividade da proposta em discussão é bastante questionável. Afinal, o que acontece se as empresas reduzirem o pagamento de dividendos ou optarem por remunerar o investimento de capital de outra maneira? A reposta também parece óbvia: haverá aumento de complexidade e contencioso tributário.
A tributação global tem como seus pilares (bases de cálculo) o consumo, a renda, a folha de salário e o patrimônio. A OCDE e o IPEA apontam que o sistema tributário brasileiro é dependente do primeiro pilar (tributação do consumo), considerando que a tributação sobre o consumo corresponde a 15% do PIB brasileiro, sendo uma das cargas tributárias sobre o consumo mais altas do mundo.
O Brasil é considerado uma jurisdição com: (i) alta carga tributária total (aproximadamente 33% do PIB); (ii) o maior custo de conformidade tributária do mundo (mais de 1.500 horas/ano gastas para cumprir obrigações acessórias, como declarações, documentos e notas fiscais); e (iii) o maior volume de contencioso tributário (75% do PIB). A principal causa apontada nesse diagnóstico é a complexidade do sistema tributário brasileiro. Portanto, há consenso quanto à necessidade de uma reforma que simplifique o sistema tributário atual.
Com a aprovação da Reforma Tributária do Consumo, criou-se a expectativa de melhoria desse cenário. Entretanto, o que se vê é exatamente o oposto. A grande maioria das regras recentemente criadas promovem ainda mais incerteza jurídica, aumento da carga tributária, do custo de conformidade tributária e da complexidade do sistema.
Caminhamos a passos largos para um cenário tributário e fiscal perturbador, com todos os problemas apontados acima e uma carga tributária próxima de 40% (ou seja, 2/5 do PIB). A história nos mostra que, por muito menos, nações passaram por guerras, revoluções e crises. Fica o alerta.
Mauricio Braga Chapinoti, advogado, LL.M. em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Leiden e sócio de Gasparini Barbosa e Freire Advogados.
https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/tributacao-de-dividendos-e-boa-para-quem/